sábado, 31 de janeiro de 2009

(25)-INFALIBILIDADE DA IGREJA

A cidade de Roma, em cujo núcleo se ergue o Vaticano e a catedral de São Pedro, é o centro da cristandade porque é a sede do papa - o chefe da igreja cristã - cujo poder - nas questões ligadas à doutrina e a moral - hoje é praticamente ilimitado, uma vez que no cânone 331 do novo código de direito canônico – editado pelo Vaticano em 1983 e promulgado com a autoridade de João Paulo II – lê-se:
“O bispo da igreja de Roma, que exerce o poder dado pelo nosso Senhor a Pedro, o primeiro dos apóstolos, e que é transmitido a seus sucessores, é o chefe do colegiado dos bispos, o vigário de Cristo e o Pastor da igreja universal sobre a terra. Graças a tal poder, ele exercita a autoridade suprema, completa, direta e universal sobre a igreja, e pode exercer esta autoridade livremente em todos os tempos”.
Esta é uma tradução literal do original em latim - pode ser consultado no Código de Direito Canônico que está à venda em quase todas as livrarias católicas – e no cânone 3 ele diz ainda: “Contra sententiam vel decretum Romani Pontificis nos datur appelatio neque recursus”, cuja tradução é: Não é possível nenhum apelo ou recurso contra uma sentença do Pontífice Romano.
Sempre em relação ao poder do papa, no Cânone 338 continua-se lendo: somente o papa pode convocar os Concílios Ecumênicos aos quais todos os bispos católicos são convidados, tendo ele, ainda, o poder de interrompê-los ou revogá-los se julgar necessário, destarte é de sua inteira responsabilidade aprovar ou desaprovar as decisões ou decretos que nestes são objeto de consenso. Isso significa que os Concílios Ecumênicos ou Universais dos bispos católicos no mundo inteiro tornaram-se exclusivamente órgãos consultivos porque passou a ser do papa a ultima palavra uma vez que ele é a autoridade suprema em tudo o que se relaciona com as questões que se vinculam a doutrina e a moral.
Os sínodos, por sua vez, que têm os poderes voltados para as questões puramente administrativas e são realizados por bispos, por serem bispos, também estão subordinados ao bispo de Roma que mais uma vez è o papa.
O novo Código de Direito Canônico ratifica assim as decisões do Concilio Vaticano I - convocado por Pio IX - que se realizou entre o dia oito de dezembro de 1869 e o dia 20 de outubro de 1870, especialmente no que diz respeito aos decretos da IV seção - aprovados no dia 18 de julho de 1870 - que definem em termos conclusivos a autoridade do papa. Foi nessa famosa reunião que foi solenemente afirmado que o papa é pessoalmente infalível. Eis o texto traduzido do latim:
Nos definimos que o Pontífice Romano, quando fala ‘ex cathedra’, ou seja, como Pastor e Doutor de todos os cristãos, determina uma doutrina concernente à fé e a moral que deve ser aceita por toda a igreja devido a sua Suprema autoridade apostólica, porque ajudado como é por Deus - segundo promessa feita por Jesus a Pedro - goza da mesma infalibilidade do divino Redentor, uma vez que este queria que a sua igreja crescesse com a proteção adequada depois de organizada com a sua colaboração. Se alguém ousar discordar dessa nossa definição que seja excomungado (DenzingerSchonmetzer, Enchiridiuon Symnbolorum et Declarationum de rebus fidei et morum, n. 3074).Isso quer dizer que se alguém não crê na infalibilidade do papa está fora da igreja católica, e se não se arrepende, corre o risco de ir para o inferno.
Ao longo dos séculos em que o papa ainda não gozava dessa infalibilidade, os católicos tinham a opção de não acatar suas decisões pessoais, mas depois que o Concilio do Vaticano I deu a ele plenos poderes - consolidando-os com a infalibilidade - os católicos são obrigados a aceitá-las.
Mas, o que mudou, então? Simples, antes da declaração da infalibilidade do papa a igreja católica julgava a si mesma infalível ao nível das decisões – consensos - tomadas durante seus Concílios Ecumênicos quando nestes se definiam doutrinas relativas à fé e a moral. Vimos isso nas resoluções adotadas no Concílio de Nicéia, e voltaremos a vê-lo no quinto Concílio Ecumênico realizado em 553 d.C - o segundo de Constantinopla - quando o “acerto” entre o Imperador Giustiniano I e o papa Silvério que ele havia nomeado, permitiu que proclamasse livremente seu anátema contra Orígenes de Alexandria.
A declaração da infalibilidade papal deve ter provocado alterações radicais entre o cume e o meio da organização piramidal do catolicismo, mas seus reflexos devem ter sido amenizados antes de chegar à classe sacerdotal. Para o leigo, então, a síntese pode ser resumida assim: o consenso dos bispos - quando participes de um Concilio – renunciou à infalibilidade que possuía e a cedeu ao Papa.
É verdade que no Concilio Vaticano II os bispos da igreja católica foram particularmente colocado em evidencia, mas substancialmente nada mudou em relação ao Concilio Vaticano I conforme se vê na Constituição Dogmática “Lúmen Gentium” - luz das pessoas - sobre a igreja, promulgada no dia 21 de novembro de 1964, porque no parágrafo 25 se lê:
“Desta infalibilidade o Romano Pontífice, chefe do colegiado dos bispos, goza em virtude de seu oficio quando, como Pastor Supremo e Doutor de todos os fieis - que confirma na sua fé como irmãos - define com ato definitivo a doutrina relativa à fé e a moral. Por isso suas decisões são justamente classificadas irreformáveis por si mesmas e não em virtude de um consenso da igreja, não admitindo, portanto, apelos ou outros juízos”.
Contudo, se depois destes esclarecimentos afirmarmos a um teólogo católico que dos textos do novo testamento não se deduz de forma alguma que Pedro – aquele que a igreja católica viria a nomeá-lo o primeiro papa – quando em Roma, tenha exercido a liderança da igreja, e que o famoso versículo do Evangelho de Mateus “Tu es Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja” por vários séculos não foi interpretado como hoje o é. E se acrescentarmos ainda que é impossível entender porque foram necessários tantos séculos para que o papa chegasse a ser considerado infalível, com certeza responderá que no caso da infalibilidade papal, bem como de outras doutrinas do catolicismo romano, estas verdades eram contidas implicitamente nas escrituras, mas foram compreendidas pouco a pouco - sempre de forma crescente - até amadurecer nas teologias hoje existentes, da mesma forma que olhando a semente não se vê a arvore que ela contém, porque esta necessita de tempo – depois de plantada - para germinar, crescer e se tornar firme e robusta.
Alem disso o teólogo acrescentará que as Escrituras não são a única fonte de revelação cristã, porque alem delas existe a tradição. É assim que se exprime a este respeito o catequismo da igreja católica no parágrafo 81, citando a Constituição Dogmática “Dei Verbum” (a palavra de Deus) do Concilio do Vaticano II:
“A Sagrada Escritura è a palavra de Deus colocada por escrito sob a inspiração do Espírito Santo. Enquanto à Sagrada Tradição conserva a palavra de Deus que foi confiada por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo aos Apóstolos, e estes a transmitiram integralmente aos seus sucessores, afim de que estes iluminados pelo espírito da verdade, através da sua predicação a conservem, exponham e a difundam. Acontece assim porque a igreja, a qual foi confiada a interpretação e a transmissão da Revelação, alcance a certeza em relação a todas as coisas reveladas e não se atenha só à Sagrada Escritura. É assim que a Escritura e a Tradição devem ser aceitas e veneradas com paridade de sentimento, de piedade e de respeito”.
Essa afirmação reflete o que já havia sido declarado no Concilio de Trento no dia 8 de abril de 1546: que a revelação divina é contida “in Libris scriptis et sine scripto traditionibus”. (Denzinger 1501), no sentido das tradições que são encontradas foras das sagradas escrituras. Defendem a tese que tais tradições contem os ensinamentos que Cristo deu oralmente, mas que por uma razão qualquer não foram reportadas nos Evangelhos.
Estes ensinamentos orais - sempre segundo esta doutrina - foram posteriormente colocados de forma diferente por escrito pelos “pais da igreja”, que como vimos foram os escritores cristãos dos primeiros quatro séculos. De particular importância são considerados os testos dos “pais da igreja” da primeira metade do segundo século.
Mas a verdade é que em vários aspectos as doutrinas da igreja católica, a começar com o próprio papado, são muito diferentes de quanto é possível deduzir das sagradas escrituras, ou de quanto é possível concluir dos testos dos próprios “pais da igreja”. Alem disso, notam-se algumas divergências doutrinais entre o testemunho do novo testamento e as afirmações destes mesmos “pais da igreja”.
Ora, se como dizem os documentos católicos, as duas fontes da Revelação divina – as sagradas escrituras e a tradição – brotaram de uma única fonte, estas diferenças não deveriam existir. Entretanto existem como será demonstrado.
O papa, nos documentos oficiais da igreja é oficialmente chamado “Vicarius Christi” - vigário de Cristo. Mas qual é o significado de Vicarius? Em latim indica quem substitui alguém, toma o lugar de outra pessoa ou representa outro individuo. Nesse caso significa que o papa representa Cristo sobre a terra. Tem-se assim a nítida impressão que o papa poderia dizer a todos aquilo que Cristo disse a Filipe a propósito do seu relacionamento com o Deus Pai. Mas mudando naturalmente os termos da comparação, o papa poderia dizer isso: Quem quer que seja que tenha visto a mim, viu Jesus Cristo, plagiando o Apostolo João:
João 14:9- Respondeu Jesus: “Há tanto tempo que estou convosco e não me conheceste, Filipe! Aquele que me viu, viu também o Pai. Como, pois, dizes: Mostra-nos o Pai”.
Sim, todos os papas sempre se consideraram os substitutos oficiais do Cristo na Terra, contudo, em termos históricos, independentemente do nome que assumiram, não se tem noticia de nenhum que tenha sido equivalente aos últimos papas, ou pelo menos “que tenha sido visto e entendido” como hoje o são. Sempre houve bispos na igreja de Roma, mas estes jamais tiveram tanta autoridade em relação à igreja como hoje possuem. Somente o pleno consenso em um Concílio geral - com a participação da maioria dos bispos – tinha essa prerrogativa.
Mesmo assim, de uma forma ou de outra, a igreja de Roma sempre manteve uma liderança importante entre o cristianismo, e a razão é que por séculos, devido ao interesse do império romano, ela reinou absoluta. Seu status não se debilitou nem quando Constantino I deixou Roma e fez de Constantinopla a capital política do seu império.
Podemos confirmar o que dissemos por um importante documento, já citado, que se relaciona com a posição da igreja no império romano: o Edito de Tessalonica emitido por Teodosio I - imperador do oriente, e Graciano - imperador do ocidente, no ano 380. Dois anos depois, em 382, Teodosio concluiu aquele histórico tratado com os Visigodos porque tinha a esperança de poder utilizar suas tropas a serviço do império. Coube a Teodosio, alem disso, ajudar o imperador do ocidente em varias oportunidades, mas o que lhe deu destaque na historia, foi a sua “vitória” sobre o paganismo através do Edito de Tessalonica, que elevou o cristianismo ao status de ser a única religião permitida. O Edito, preservado no código de Justiniano - o imperador que implementou o direito romano no VI século – traduzido para o Português é o seguinte:
“Dos imperadores Graciano Valentiniano e Teodosio ao povo da cidade de Constantinopla. Todas as nações governadas pela nossa clemência, permanecerão com a religião que foi transmitida pelo Apostolo Pedro aos romanos e que hoje é liderada pelo pontífice Damaso e por Pedro, bispo de Alexandria e homem de santidade apostólica, porque acreditamos que - segundo o ensinamento apostólico e a doutrina evangélica - só existe um Deus que subsiste em tres pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo, que gozam da mesma dignidade e que constituem a Santíssima Trindade. Ordenamos conseqüentemente aos que observam esta lei de assumir o nome de ”Cristãos Católicos”, enquanto todos os demais, que nos julgamos estúpidos e loucos, devem ser declarados heréticos. Estes serão punidos não só pela ira de Deus, mas também pela nossa autoridade, guiados, que somos, pela sabiedade divina.”
Esse documento confirma que a igreja cristã, cujas portas, em Roma, haviam sido abertas por um decreto, o Edito de Milão, dezenas de anos depois, permanecia sendo uma instituição que, se por um lado a sua fé era alimentada por Damasco - bispo de Roma, e pelo bispo de Alexandria - a segunda igreja em importância, para sobrepujar as demais religiões, as pagãs, permanecia dependente de decretos. Estas, então, passaram a ser perseguida, e para extinguí-las, entre os anos 391 a 392 tiveram seus templos fechados. Desse modo, em 394 d.C. o império havia sido finalmente cristianizado... mas cristãos não eram mais aqueles que se caracterizavam pela fé em Cristo, mas por todos os que tinham entendido - considerando que o cristianismo era a única religião permitida - que se tornar cristão era uma questão de sobrevivência. Mais tarde, como também já vimos, a igreja de Alexandria veio a ser excomungada.
Mas por que razão o bispo de Roma tornou-se cada vez mais importante? Os apóstolos Pedro e Paulo foram para Roma, e nessa cidade desempenharam seu ministério apostólico. Conseqüentemente, como foi em Roma que ensinaram, tudo o era dito nas demais igrejas devia estar de pleno acordo com o que emanava daquela de Roma. A conseqüência não podia ser outra: na mesma medida em que o catolicismo se tornava mais forte, os papas se fortaleceram com ele.
Esse conceito vigorava já na segunda metade do II século, porque o próprio Ireneu, bispo de Lion, na sua obra “contra as heresias” fala da igreja de Roma como sendo a “igreja maior e mais antiga”, alem de conhecida por todos, porque havia sido fundada pelos Apóstolos Pedro e Paulo. Destarte, ele dizia, todas as demais igrejas devem se manter acordadas com esta igreja por causa da sua maior autoridade “(Ireneu, Contra as heresias III,3,2)”.
Leopoldo Ranke, famoso historiador alemão do século passado, afirma no primeiro capitulo da sua obra “historia dos papas” que era uma pretensão efêmera garantir que a supremacia dos bispos de Roma, já depois do primeiro século, era universalmente reconhecida. Mas logo depois acrescenta: temos que reconhecer, entretanto, que os bispos de Roma souberam se elevar acima de todos os demais dignitários eclesiásticos em bem pouco tempo.
A esse propósito existe um importantíssimo documento, tradicionalmente conhecido como “decreto Gelasiano” porque é atribuído a Gelasio I, bispo de Roma entre os anos 492 a 496. Esse documento, dizem, é o resultado de um sínodo romano que se realizou no ano 494, è nele é claramente afirmada a origem apostólica do papado, e contribui para a supremacia do bispo de Roma sobre toda a igreja cristã.
Explicitamente esse documento afirma que, mesmo se a igreja de Cristo, espalhada pelo mundo, é uma só, “a igreja de Roma não foi preposta as demais igrejas por um sínodo eclesiástico, mas recebeu essa supremacia através da própria voz do Senhor e Salvador nosso (Denzinger 350)”
Esse documento se serve do Evangelho de Mateus - como vimos o único que faz esta citação - onde, no versículo 16:18-19, Jesus diz a Pedro: E eu te declaro: tu es Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja; as portas do inferno não prevalecerão contra ela. Eu te darei as chaves do Reino dos céus: tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e todo o que desligares na terra será desligado nos céus.
Existem outras igrejas importantes, mas a de Roma, com o seu bispo, é a mais importante e tem a supremacia sobre todas as demais. Esta é a substancia do decreto Gelasiano. Este conceito doutrinal, ao longo dos séculos, continuou sendo desenvolvido e aprimorado até assumir os contornos que os últimos Concílios Ecumênicos lhe deram.
Os séculos escorreram, e neles, das sociedades cada vez mais distanciadas pelos interesses políticos que historicamente as dividem, brotaram os novos teólogos cristãos, e estes, balizados por suas próprias tendências pessoais - como não havia mais nada de novo para extrair dos Evangelhos em termos de religiosidade - começaram a retirar desses testos aquilo que os “evangelistas” jamais haviam inserido, ou seja, faces políticas. Resultado: no seio da igreja começaram a florescer, então, cisões provocadas por tendências de cunho político. Sem duvidas, a melhor estratégia para controlá-las, foi retirar dos bispos o poder do consenso, nos Concílios, transformando-o na infalibilidade do papa.

Aproxima-se o ano de 1870, que assinalaria a falência da igreja com a declaração da infalibilidade papal, o Catolicismo experimenta provações amargas e dolorosas.
Exaustos de suas imposições, todos os povos cultos da Europa não enxergaram nas suas instituições senão escolas religiosas, limitando-se-lhes as finalidades educativas e controlando-se-lhes o mecanismo da atividade.
Compreendendo que o Cristo não tratara de açambarcar nenhum território do globo, os italianos, naturalmente, reclamaram os seus direitos no capítulo das reivindicações, procurando organizar a unidade da Itália sem a tutela do Vaticano. Desde 1859, estabelecera-se a luta, que foi por muito tempo prolongada em vista da decisão da França, que manteve todo um exercito em Roma para garantia do pontífice da igreja. Mas a situação de 1870 obrigara o povo francês a reclamar a presença dos guardas do Vaticano, triunfando as idéias de Cavour e privando-se o papa de todos os poderes temporais, restringindo-se a sua posse material.
Começa, com Pio IX, a grande lição da igreja. O período das grandes transformações estava iniciado, e ela, que sempre ditara ordens aos príncipes do mundo, na sua sede de domínio, iria tornar-se instrumento de opressão nas mãos dos poderosos.
Observa-se um fenômeno interessante. A igreja, que nunca se lembrara de dar um titulo real á figura do Cristo, assim que viu desmoronarem-se os tronos do absolutismo com as vitórias da Republica e do Direito, construiu a imagem do Cristo Rei para o cume dos seus altares.
Fonte: livro “A Caminho da Luz” pelo espírito Emmanuel
e psicografado por Francisco Candido Xavier.

Infalibilidade... inicialmente a dos bispos nos Concílios, e posteriormente a papal. Segundo ela, por se julgar herdeira do Paraclito, jamais esteve vulnerável a erros, portanto infalível. Mas....
· A mulher, que no velho mundo era enaltecida e endeusada pelas doutrinas pagãs, por ser aquela que por dádiva divina gerava a vida em suas próprias entranhas, nas escrituras sagradas a situação dela é invertida: existe como sub produto do homem - visto que é criada a partir da sua costela - Gênese 1:21, é tornada desprezível, porque é acusada de ter desobedecido a Deus quando, ouvindo a serpente, não somente comeu o fruto proibido, mas fez com que Adão o comesse também –Gênese 3:6, tornando-o responsável pelo pecado original. Com estas premissas, como já vimos, foi descrita a pecadora inconseqüente dos Evangelhos, perdoada por Jesus, rotulada que foi Maria de Magdala, e mais tarde, através dos escritos de Sto. Agostinho de Hipona - 354-430 - e São Jerônimo -342-420 - além de outros santos do V século, foi considerada um ser inferior, tanto no aspecto moral quanto espiritual. Com estes sábios retoques, a igreja disseminou tanto a crença que a mulher era inferior, que alguns teólogos chegaram a discutir se a mulher teria alma ou não. Mulheres, sexo, e corpo humano, foram oficialmente considerados por esta igreja distrações e tentações capacitadas a desviar o homem do caminho espiritual.
· Papa Libério - 325-366 - aderiu formalmente à chamada heresia ariana, aquela que negava a divindade de Cristo assim como foi entendido no Concílio de Nicéia, subscrevendo a profissão de fé, depois chamada herética, do Concílio de Sermio, chegando a excomungar Atanásio que defendia a divindade de Cristo. Tudo isso depois que ele mesmo, anteriormente, havia se posicionado contra a doutrina de Ario.
· Papa Inocêncio I - 401-417 - escreveu ao Concílio de Milevis que os recém nascidos eram obrigados a receber a comunhão, porque se viessem a morrem batizados, mas não comungados, iriam para o inferno. Esta tese acabou sendo anulada pelo Concílio de Trento em 1562 e substituída com a seguinte declaração: o santo sínodo ensina que as crianças que ainda não possuem a razão, não são obrigados à comunhão sacramental da eucaristia. Regenerados e incorporados a Cristo através do batismo, não podem, com aquela idade, perder a graça de serem filhos de Deus que conquistaram. Concílio de Trento, Sess. XXI, cap.IV. No mesmo Concílio, na Sess. XXI. Cap. IV, foi definido: será excomungado aquele que continuar dizendo que a comunhão eucarística é necessária para as crianças antes de terem completado a idade da razão.
· Papa Ormisda - 514-523 - declarou heréticos alguns monges de Shizia porque sustentavam que uma pessoa da trindade tinha morrido na cruz. Depois disso, em 532, o Papa João II declarou que aqueles monges ortodoxos eram pessoas que sustentavam uma doutrina reta.
· Papa Virgilio - 537-555 - em 553, com uma declaração oficial definiu adequados à doutrina católica alguns textos chamados “três capítulos” - que ele mesmo tinha condenado cinco anos antes . Entretanto, no quinto Concílio Ecumênico que se realizou em Constantinopla entre o dia cinco de maio e o dia dois de junho daquele mesmo ano, foi declarado que os textos contidos nos “tres capítulos” eram heréticos. Virgilio, no entanto, só aceitou o Concílio e as disciplinas ali decididas seis meses depois no dia oito de dezembro. Nesta data, ele escreveu ao Patriarca de Constantinopla que reconhecia o seu erro. Portanto, escreveu, o que eu fiz para defender os “três capítulos” está sendo neste momento cancelado através do presente texto. Vide Epistola a Eutíquio, Patriarca de Constantinopla, do dia oito de dezembro de 553).
· Papa Gregório I, dito Magno - 590- 604 - afirmou que depois que o homem dormiu com a sua mulher, não pode entrar na igreja até se lavar e fazer sua penitencia, porque a sua vontade permanece contaminada. O matrimonio em si mesmo não é pecaminoso, mas o sexo entre os cônjuges é sempre impuro. O pecado original, dizia, é a corrupção inata da alma que assume a forma de desejo da concupiscência, a rebelião da carne contra o espírito. Por causa do pecado de Adão, toda a humanidade é suja e danada, como se Adão, o primeiro homem, tivesse contraído uma doença contagiosa e através dela conspurcasse todos seus descendentes.
Contudo, se considerarmos que a igreja afirma que essa culpa é “lavada” pelo batismo, deduziremos que o filho de um casal batizado è limpo. Errado. Gregório explicava que isso era impossível porque a procriação acontece através de um ato sexual, portanto pecaminoso. Assim, se as crianças não batizadas morressem, iam direto para o inferno onde iam sofrer pela eternidade. Esta doutrina depois foi alterada e as crianças que não eram batizadas, em caso de morte, não iam mais para o inferno, mas para o limbo onde não havia penalidade alguma. O mesmo Gregório I afirmou que quem assumia o titulo de bispo universal - Papa -era precursor do anticristo, enquanto Gregório VII, - 1073-1085 - afirmou que o bispo de Roma era e devia ser chamado bispo universal. Suas palavras: “Só o pontífice romano tem o direito de ser chamado universal”. (Dictatus papae, punto 2).
· Papa Adriano II - 867-872 - declarou que o casamento civil era valido, enquanto Pio VII, mil anos depois - 1800-1823 - o condenou.
· Papa Pascoal II - 1099-1118 - e Papa Eugenio III - 1145-1153 - autorizaram o duelo (a luta com armas iguais), mas Julio II (1503-1513) e Pio IV (1559-1565) o proibiram.
· Em 1140, em Lion, região de Proença, França, foi celebrada - depois de um longo período de gestação no Vaticano - a festa da Imaculada Conceição de Maria. Este evento, teve o objetivo de proclamar que Maria, a mãe de Jesus, também tinha sido “concebida de maneira imaculada” por seus pais Ana e Joaquim. Na oportunidade, São Bernardo de Claraval declarou que a nova festividade era algo que os costumes da igreja desconheciam e a razão não comprovava. A inclusão desta nova teologia, a “ Virgem Maria concebida sem pecado”, refletia o dogma da igreja romana de que o sexo, mesmo no casamento, é pecaminoso.
· Papa João XXII - 1316-1334 - em 1331 afirmou que as almas dos santos não eram abençoadas por Deus antes da ressurreição da carne. Esta declaração foi considerada uma heresia e condenada pelo seu sucessor Benedito XII - 1334-1342. O mesmo papa João XXII, na sua declaração “Cum inter nonnullos” de 1323, afirmou: “dizer que Cristo e os apóstolos nada possuíam significa extravasar as escrituras” (citado por Peter de Rosa in Vigários de Cristo, Milão 1989, pág.226). Afirmavam, portanto, que Cristo e seus apóstolos não viveram pobres, contrastando frontalmente com as afirmações de seus predecessores Onorio III, Inocêncio IV Alessandro IV e Bonifácio VIII.
· Papa Sisto V - 1585-1590 - em 1590, fez publicar uma edição da Vulgata (que pessoalmente havia reescrito para corrigir os erros contidos nas edições até então publicadas), declarando: na plenitude do poder apostólico, decreto e declaro que esta edição, aprovada pela autoridade a mim conferida pelo Senhor, deve ser acolhida e considerada verdadeira, legitima, autentica e inconteste em todas as discussões publicas e privadas, nas leituras, nos sermões e nas explicações. Pouco tempo depois da publicação da sua vulgata Sisto morreu, mas o texto por ele publicado estava cheia de erros. O Cardeal Bellarmino, para salvar a honorabilidade de Sisto V, sugeriu ao seu sucessor Gregório XIV - 1590-1591 - que fizesse as correções e reapresentasse a Vulgata ao publico como sendo de Sisto V com as desculpas devidas. Mais tarde, na sua autobiografia, Bellarmino disse: algumas pessoas, cuja opinião tinha grande peso, julgavam que a Vulgata do Papa Sisto V devia ser proibida publicamente; eu não era da mesma opinião e demonstrei isso ao Santo Padre dizendo: ao invés de proibir a versão em questão, é melhor corrigi-la e publicá-la novamente sem prejudicar a imagem do Papa Sisto. Para fazer isso, era suficiente eliminar os textos desaconselháveis e retornar a publicar o volume com o nome de Sisto. Para justificar o ocorrido, era só acrescentar um prefacio explicando que os erros contidos na edição anterior eram decorrentes da pressa dos tipógrafos e de outras pessoas. Isto significa dizer que o Cardeal sugeriu que o Papa mentisse. A Vulgata de Sisto V, depois de corrigida foi publicada em 1592 pelo papa Clemente VIII - 1592-1605 – depois de ter retirado do mercado as copias da Vulgata anterior;
· Papa Paulo V - 1605-1621 - em 1616, fez chamar a atenção Galileu Galilei que sustentava que a Terra, além de se mover sobre si mesma, girava ao redor do Sol. Em um documento do Santo Oficio datado em 25 de fevereiro de 1616 se lê: O Ilustríssimo Senhor Cardeal Millino notificou o assessor e o comissário do Santo Oficio, que entregue à censura dos Padres Teólogos a preposição do matemático Galileu que afirma que o Sol é o centro do mundo e isento de movimento próprio, e que a Terra se move também de movimento diurno. O Santíssimo papa Paulo V ordenou ao Ilustríssimo Senhor Cardeal Millino que chamasse diante de si o pré-citado Galilei, exigindo que abandone a sua opinião. Em caso de desobediência o padre comissário, diante de um escrivão e de testemunhas, deve citá-lo para que se abstenha totalmente de continuar ensinando, defender ou tratar da sua tese. Se não obedecer deverá ser encarcerado. Assim foi feito e Galileu atendeu. Mas dezesseis anos depois, em 1632, quando o para era Urbano VIII, Galileu fez estampar seu livro “Dialogo di Galileo Galilei a respeito dos dois máximos sistemas do mundo: Tolemaico Copernicano” no qual, sob a forma de um dialogo, sustentava as suas convicções. Foi assim que o tribunal da Inquisição o chamou a Roma e o processou, condenando-o por heresia. No veredicto que emanou contra ele em 1633 se lê: Afirmamos, pronunciamos, sentenciamos e declaramos que você, chamado Galileu, pelas coisas deduzidas no processo e confirmadas por ti, tornou-se diante deste santo oficio veementemente suspeito de heresia, ou seja, de afirmar - contrariando frontalmente as Sagradas Escrituras - que a terra, ao invés de ser o centro do mundo, se move sobre si mesma e ao redor do Sol..... E Galileu foi obrigado a jurar sobre o Evangelho: abjuro, maldigo e detesto meus erros e heresias e todos os demais erros, heresias ou seitas contrárias à Santa Igreja. 189 anos depois, portanto em 1822, o papa Pio VII alterou um decreto da Inquisição e reconheceu os tratados de Copérnico sobre a astronomia. Em 1835, as obras de Copérnico, Kepler e Galileu foram finalmente retiradas do índice de livros proibidos.
Estes fatos, que poderiam ser interpretados como aberrações de mentes deformadas, não devem ser julgados isoladamente, mas a luz das atitudes que a humanidade, como um todo, assumiu ao longo daqueles séculos, independentemente de onde o homem estava ou da função que exercia, porque em cada um dos seus momentos refletiu o degrau que até então este alcançara na escada da sua evolução a partir do ponto “zero”. A fase hominídea.
Contudo, muito distante ainda estamos do momento em que do futuro, poderemos olhar o passado e julgá-lo, porque nossos atos, como atestam diariamente os jornais do mundo, mesmo se estamos no século XXI, continuam sendo tão abomináveis como os que foram historiados até agora nessas paginas.
Mesmo o Papa Wojtyla, ou melhor, João Paulo II, aquele que foi chamado o Papa que pede perdão, não foi uma exceção à regra:
· No dia 22 junho de 1996, em Paderbon, na Alemanha, a respeito da reforma de Martim Lutero e a separação com as igrejas evangélicas disse:
Hoje, 450 anos depois da morte de Martim Lutero, o tempo que passou permite compreender melhor a pessoa e a obra do reformador alemão e ser mais equânime com ele....A solicitação de reforma da igreja feita por Lutero, no seu intento originário, era um apelo a penitencia e a renovação. Muitos são os motivos pelos quais daquele inicio chegou-se posteriormente a cisão. Entre estes a não correspondência da igreja católica. Estes dizeres, com certeza, não são um pedido de perdão.
· No dia 14 de setembro de 1987 em Phoenix, Usa, a respeito do sofrimento infligido pela igreja aos índios durante a conquista da América disse: É necessário reconhecer a opressão cultural, as injustiças, a destruição da vossa vida e das vossas sociedades tradicionais....Contudo, não todos os membros da igreja agiram de acordo com as responsabilidades cristãs.
· Em relação às estas três questões cruciais - o caso Galileo Galilei - a relação entre a fé e a ciência, o anti-semitismo e a inquisição, João Paulo II limitou-se a constituir uma comissão de estudo para reexaminar o comportamento da igreja:
No primeiro caso, ou seja, Galilei, a comissão chegou a conclusões que trouxeram uma substancial reabilitação de Galilei, falando de uma “trágica recíproca incompreensão”, “doloroso mal entendido” e “erro dos teólogos daquele tempo”.
Substancial reabilitação de Galilei? Quem errou não foi ele, mas a igreja, e só não cometeu um erro maior porque o cientista, entre defender sua tese e salvar sua vida, escolheu a segunda opção.

Em relação aos dois outros casos, quem se manifestou foi o padre Georges Cottier, teólogo da casa pontifícia, dizendo: as premissas indicam que é desejável um exame histórico tendendo a uma conversão.
Outros posicionamentos do Papa João Paulo II através da igreja:
· No dicionário “Lexikon - Termini Ambigui e Discussi su Famiglia, Vita e Questioni Etiche” - Dicionário dos Termos Ambíguos e Discutidos sobre a Família, Vida e Questões Éticas - organizado pelo Conselho Pontifício para a família - um dos braços da Cúria Romana - entre as inúmeras “situações” que a igreja tenta impostar, encontram-se as seguintes:
-No verbete dedicado ao sexo seguro é decretado que ele não existe, e a intenção, claro, é censurar o uso de preservativos e outros métodos contraceptivos artificiais, para recomendar a abstinência total para aqueles que não são casados, e para estes, quando o objetivo não é procriar.
O autor do verbete descarrega um anátema contra a camisinha afirmando que ela reduz apenas em 10% o risco do contrair Aids em uma relação, quando, estatisticamente falando, o risco de contagio com o preservativo é reduzido para 1%.
O responsável por esta cruzada da insensatez, já condenada pela Organização Mundial da Saúde, é o Cardeal colombiano Alfonso López Trujillo, presidente do Conselho Pontifício para a família e idealizador do Lexikon. Afirma que o vírus do HIV é, mais ou menos, 450 vezes menor do que o espermatozóide, e um espermatozóide pode facilmente passar pelo tecido com que é fabricada a camisinha.
O capitulo mais assombroso, contudo, é o que pondera a respeito dos homossexuais. Após tergiversar inconclusivamente, conclui que a homossexualidade é um conflito psíquico não resolvido que a sociedade não pode institucionalizar.
É pertinente lembrar que a Organização Mundial da Saúde há mais de dez anos retirou a homossexualidade da classificação internacional de enfermidades.
O sexo, que a igreja rotula de pecado quando fora da intenção de gerar novas vidas, está por trás da obrigatoriedade do celibato do clero. Este, como as águas indevidamente retidas, em um determinado instante extravasam causando indescritíveis tragédias: os escândalos dos padres pedófilos.
A Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos divulgou recentemente dados preliminares de um relatório sobre acusações de abuso sexual envolvendo padres americanos. Segundo os dados pesquisados, 4450 representantes da igreja foram denunciados por abuso e mais de 11000 acusações foram registradas no período de 1950 a 2002. Concomitantemente ao documento que condena o casamento entre homossexuais, a igreja condenou a adoção de crianças por estes pares.
Contudo, se é inconteste que o amor é o sentimento que se responsabiliza pela união de duas pessoas, e se é verdadeiro que instintivamente após o ajuntamento as duas desejam se perpetuar, mesmo recorrendo à adoção quando seus corpos estão impossibilitados de se fertilizarem, porque negar a adoção aos casais homossexuais?
Será que os milhões de crianças desamadas, abandonadas ou retidas nos orfanatos ao redor do planeta, não encontrariam o carinho e o aconchego que carecem se fossem envolvidas pelo amor destes pares?
Em uma de suas ultimas declarações o santo padre esclareceu que os homens, ao domingo à tarde, ao invés de freqüentar estádios de futebol, deveriam freqüentar as igrejas para se manterem mais perto de Deus! Hora, isso não contraria o que é ensinado pela doutrina cristã quando diz que Deus é onisciente e onipresente?

A igreja católica decidiu adotar uma medida extrema para inibir os escândalos sexuais envolvendo padres: dificultar a ordenação de homossexuais. A decisão já foi tomada pelo Papa Bento XVI, de acordo com fontes do Vaticano, mas só deve ser anunciada oficialmente nas próximas semanas. Como parte da nova política, a ser aplicada em todo o mundo, uma equipe de religiosos será enviada pelo Vaticano para investigar cada um dos 229 seminários dos Estados Unidos em busca de “indícios de homossexualismo”. A intenção é entrevistar cada um dos 4500 seminaristas e submetê-los a um questionário de cinqüenta perguntas, no qual deverão expor sua opção sexual e sua opinião sobre o celibato.
As novas regras determinam que sejam excluídos todos os seminaristas que admitam ser homossexuais, mesmo que se comprometam a manter a castidade “A questão são as tentações especificas dos seminários, em que só há homens” diz o padre Robert Silva, presidente da federação dos padres americanos. Diferentemente dos seminaristas, os padres não serão expulsos, desde que respeitem o voto da castidade.
Padre Silva diz que membros importantes da hierarquia católica americana estão tentando dissuadir o Vaticano de divulgar o documento, sob o argumento de que iria criar mais problemas do que soluções entre o clero.
A igreja católica considera o homossexualismo uma depravação grave. Um documento do Vaticano, de 1961, recomenda que seminaristas com “inclinações perversas á homossexualidade ou pederastia”, não sejam ordenados padres. A igreja católica nos Estados Unidos nunca seguiu à risca ou de modo uniforme essa determinação. Em muitos seminários não há restrições para candidatos a padre que admitem abertamente ser gay.
Não é apenas por isso que os seminários americanos estão recebendo atenção especial do Vaticano. Uma enxurrada de denuncias de abusos sexuais envolvendo sacerdotes, sobretudo casos de pedofilia, mergulhou a igreja católica dos Estados Unidos na maior crise de sua historia.
Só no ano passado foram 1092 acusações contra 756 padres. A maioria dos casos tinha ocorrido anos antes, mas só agora as vitimas tiveram coragem de denunciar os sacerdotes. Boa parte dos processos foi resolvida com o pagamento de indenizações que custaram à igreja um bilhão de dólares. Pior para o prestigio da igreja foram às revelações de que no ano passado muitos padres acusados usufruíram a proteção de bispos e cardeais e, em muitos casos, a única punição foi a transferência para outra paróquia. Esse foi o caso do padre John Geoghan, finalmente condenado pelo abuso de 130 crianças.
Fonte: revista Veja de 28 de setembro 2005
Dogmas:
· Ano 310: Começa-se a orar pelos mortos.
· Ano 320: Começa-se a usar velas nas igrejas.
· Ano 325: É oficializada a oração “o credo” - Regula Fidei.
· Ano 416: É instituído o batismo para os recém nascidos.
· Ano 431: Maria, a mãe de Jesus, começa a ser cultuada, depois de ter sido decidido no concilio de Trento que ela concebeu virgem.
· Ano 503: È instituída a existência do purgatório - a igreja passa a cobrar para que as almas sejam perdoadas e sigam para o paraíso.
· Ano 783: Inicia-se a veneração das imagens.
· Ano 830: Passa a ser utilizada a água benta.
· Ano 933: É iniciada a canonização dos santos.
· Ano 1074: É instituído o celibato
· Ano 1190: São criadas e negociadas as indulgências.
· Ano 1208: Começa a ser elevada a hóstia para adoração.
· Ano 1215: Papa Inocêncio I institui a transubstanciação.
· Ano 1216: Instituída a confissão.
· Ano 1221: Os Dominicanos criam a oração “Salve Rainha”.
· Ano 1317: Foi escrita e difundida pelo papa João XXII a oração Ave Maria.
· Ano 1854: O papa Pio IX declara a “Imaculada Concepção” de Maria, a Mãe de Jesus. Não que tenha sido concebida virgem, mas sem o pecado origina.
· Ano 1879: Infalibilidade papal.

“Existe uma anedota medieval sobre um judeu que faz uma viagem até a corte pontifícia e se converte ao catolicismo. Na sua volta, um sujeito que conhece bem o ambiente papal pergunta-lhe se ele fazia idéia do que acontecia por lá. ”Sim, é claro”, responde o primeiro, “vi todas aquelas coisas escandalosas.”
“E ainda assim você se tornou católico!? É um contra senso”, espanta-se o outro.
Replica o judeu convertido: “Justamente por isso me tornei católico. Porque, se a igreja continua a existir apesar de tudo, então deve haver de verdade alguém que a mentem de pé”.
Também se conta que Napoleão disse uma vez que aniquilaria a igreja. Um cardeal, então, teria respondido: “Mas nem mesmo nos fomos capazes de fazê-lo!”
Agora vamos conhecer um dos muitos pensamentos do papa Bento XVI: “As religiões são consideradas todas equivalentes”. Mas isso é falso. Existem, de fato, formas religiosas degeneradas e corruptas, que não edificam o homem, mas o alienam; a critica marxista à religião não era de todo vazia, e também religiões nas quais se deve reconhecer uma dimensão moral e uma correta colocação no caminho da verdade.
No hinduismo existem aspectos formidáveis, mas também aspectos negativos. E o Islã, apesar de toda a sua grandeza, corre sempre o risco de perder o equilíbrio, dando espaço a violências e deixando a religião escorregar para a exterioridade e o ritualístico”.
A formula encontrada pelos grandes teóricos do ecumenismo é que devemos ir adiante, prosseguir no nosso caminho. Não se trata de propor anexações, mas de esperar que o Senhor desperte a fé em todos os lugares e ofereça uma meta comum aos seus diversos caminhos, para que desemboquem numa só igreja.
Como católicos, estamos convencidos de que esta igreja única já existe em sua forma fundamental na igreja católica, mas pensamos que também esteja num caminho em direção ao futuro “.
No entanto, o que acontece no mundo - especialmente na Europa que foi o berço do cristianismo - demonstra que o pensamento do papa está muito aquém da realidade, porque no tempo a freqüência dos fieis nas igrejas é cada vez menor.
País % dos católicos que vão à igreja
Holanda 10%
França 12%
Áustria 15%
Espanha 18%
Itália 25%
Portugal 27%
Irlanda 44%
Polônia 50%
A Alemanha, terra natal de Bento XVI, oferece um bom exemplo de como isso ocorre. Pesquisa realizada nas maiores cidades do país mostrou que menos da metade dos cristãos praticantes seguem as orientações morais de suas igrejas. O catolicismo divide com o protestantismo luterano a preferência religiosa dos alemães. Há 26.2 milhões de católicos e 25.8 milhões de luteranos. Somados, eles representam quase dois terços da população. Ambas as religiões são atormentadas pela evasão de fieis. A igreja católica perde 120.000 fieis por ano. A luterana perde 100.000. Na Alemanha, esses números podem ser calculados com segurança porque os fieis pagam um imposto religioso, recolhido pelo governo e repassado às igrejas. Quem quiser suspender a contribuição – que representa 10% do que é pago em imposto territorial e de renda para o Estado - deixa oficialmente de ser membro da igreja. O “imposto de igreja”, criado no século XIX, foi incorporado à constituição da Alemanha depois da II guerra.
“A pergunta que os alemães fazem é para que, afinal, eles precisam da igreja”, disse a Veja o teólogo alemão Medard Kehl, professor da Faculdade Filosófica e Teológica de Frankfurt, na Alemanha. “A conclusão é muitas vezes a de que estão pagando apenas para comemorar o Natal de cada ano e celebrar o casamento uma vez na vida. Se for assim, não há razão para continuar a ser membro da igreja”. Nas ultimas duas décadas, o Vaticano foi especialmente severo com a ala mais liberal da igreja católica alemã. O cardeal Ratzinger, como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, foi o ideólogo de boa parte dessas medidas. Na década de 90, exigiu obediência dos teólogos alemães às instruções de ensino determinadas por Roma. Há tres anos, o papa João Paulo II proibiu as paróquias alemãs de manter centros de aconselhamento de gestantes, uma atividade que era subsidiada pelo governo da Alemanha. Quase 300 centros foram fechados com o argumento de que estavam facilitando o acesso das mulheres grávidas ao aborto legal. E, há dois anos, um padre católico foi suspenso por dar a comunhão a 2000 pessoas em uma igreja protestante onde realizou uma missa ecumênica. Bento XVI sabe das dificuldades que enfrentará em sua terra natal. Em uma entrevista publicada no livro “O Sal da Terra”, de 1997, ele disse sobre a Alemanha: “Aumenta, por todos os lados, a divisão interior da igreja e o desinteresse pela fé”.
Fonte: revista Veja de 27 de abril 2005

Nos últimos meses de 2005 a cantora baiana Daniela Mercury, declaradamente católica, foi contratada pelo Vaticano para participar do concerto do Natal daquele ano, mas, quando os organizadores do evento souberam que Daniela, no Brasil, havia participado de uma campanha para estimular o uso da camisinha, por ser uma atitude desnaturada aos olhos da igreja, foi demitida. Isso porque não obstante o vertiginoso incremento da AIDS entre os heterossexuais, ela continua proibindo a adoção desta profilaxia. Este é um lado da sua moeda. Do outro, está o exercito de padres pedófilos que continua tentando ocultar

(24)-JESUITISMO

Em 1534 surgiu no cenário do catolicismo romano mais uma pagina negra. O espanhol Inigo Lopez de Recalde, ex-pagem da corte, não podendo mais retornar a esta função por ter perdido a sua aparência física devido aos dois ferimentos que, como militar, recebeu na batalha de Pamplona, adotou o pseudônimo Inácio de Loiola e fundou a ordem dos jesuítas. Para recompensá-lo, foi santificado em 1621 pelo papa Gregório XV.
O juramento dos jesuítas –que pode ser lido no livro “Congressional de Relatórios” na página 3262 - em síntese diz: ”prometo ensinar a guerra lenta e secreta contra os protestantes, maçons, etc. queimar vivos esses hereges, usar o veneno, o punhal ou a corda de estrangulamento... farei arrancar o estomago e o ventre de suas mulheres e esmagarei a cabeça de seus filhos contra a parede a fim de aniquilar a raça “! “Se eu for perjuro, as milícias do papa poderão cortar meus braços e minhas pernas, degolar-me, cortando minha garganta de orelha a orelha, abrir minha barriga e queimá-la com enxofre etc”. Assino meu nome com a ponta deste punhal molhado no meu próprio sangue.
A ordem dos Jesuítas foi repudiada pelo Papa Clemente VII que os chamou de intrigantes, mas foi o Papa Clemente XIV, no dia 31 de julho de 1773, que aboliu a sua ordem. Entretanto, esse não foi o seu fim, porque em 1914 o Papa Pio VII a restaurou afirmando que eram os defensores do papa e o braço direito da igreja.

A Companhia de Jesus, de nefasta memória, não procurava conhecer os meios, para cogitar tão somente dos fins imorais a que se propunha.
Sua ação desdobrou-se por largos anos de treva, nos domínios da civilização ocidental, contribuindo amplamente para o atraso moral em que se encontra o “homem cientifico” dos tempos modernos.
Suas hordas de predomínio, de cupidez e de ambição não martirizaram apenas o mundo secular. Também os padres sinceros sofreram largamente sob sua preponderância nefasta. Tanto assim que, quando papa Clemente XIV tentou extingui-la, em 1773, com seu breve “Dominus ac Redemptor”, exclamava desolado: “Assino minha sentença de morte, mas obedeço à minha consciência.” Com efeito, em setembro de 1774, o grande pontífice entregava a alma a Deus, no meio dos mais horrorosos padecimentos, vitimado por um veneno letal que lhe apodreceu lentamente o corpo.
Fonte: livro “A Caminho da Luz” pelo espírito Emmanuel
e psicografado por Francisco Candido Xavier

(23)-SANTA INQUISIÇÃO

Depois que o Édito de Tessalonica transformou a igreja católica apostólica romana na única religião permitida no Império, ela começou sua luta contra os hereges, mesmo se ao longo dos primeiros séculos, contra eles, se limitava a aplicar penalidades de caráter espiritual. De fato, durante aqueles anos, a penalidade máxima aplicada a uma herege era um anátema, porque a igreja ainda era contraria a aplicação de penalidades físicas. “Fides suadenda non imponenda” - a fé deve ser objeto de persuasão não de imposição, dizia. No entanto, quando constatou que essa pratica não era tão eficiente como pensava - porque os hereges ao invés de diminuírem, aumentavam - no Concilio Laterano IV, em 1215, para condenar todas as formas de desvio religioso, o consenso permitiu a elaboração da “Procedura di ufficio” - uma autorização que permitia instaurar processos por heresia mesmo sem provas, em outras palavras, por suspeitas ou delação. 16 anos depois, conseqüentemente em 1231, como os processos por heresias careciam de penalidades mas efetivas, o papa Gregório IX instituiu o tribunal da Santa Inquisição. Este conselho foi mantido subordinado a Roma, mas a coordenação foi delegada aos frades Franciscanos e Dominicanos, responsabilizando-os por este meio pela condenação e punição dos heréticos, ou seja, aqueles que eram acusados de praticar cultos dessemelhantes dos que eram praticados na doutrina da igreja católica.
Sob a égide desses frades, os tribunais da Inquisição - para salvá-los espiritualmente - levaram a fogueira, ao cadafalso, ou à tortura milhares de pessoas, porque segundo eles, esta mesma salvação não podia ser adquirida sem a tutela da Santa Mãe Igreja.
A simples suspeita, o ódio por uma ou mais pessoas, ou a inveja, tornaram-se instrumentos para acusar de herege qualquer um. Desse modo, este podia ser um inimigo - aquele que discordava de seus pontos de vista - um freqüentador de mulheres de vida fácil, aquele que comia carne na sexta feira, que não ia a missa, que não fazia a comunhão, que lia livros proibidos, que expunha idéias não aceitas, mesmo a nível cientifico, ou que freqüentava pessoas mal vistas pelas autoridades da igreja etc. etc. Todos estes aspectos passaram a ser considerados teologicamente validos para merecerem um julgamento pelo tribunal da inquisição. Em 1252, o papa Inocêncio IV, emitiu a declaração “ad extirpanda”, oficializando por este instrumento tortura como um método fatível para trazer á luz a verdade. Neste meio tempo, Tomás de Aquino, Dominicano Italiano mestre em teologia, escrevia na sua obra “Suma Teológica” : condenar alguém só por suspeita, equivale ao cometimento de um pecado mortal.
Em 1320 concluiu-se uma outra sentencia: uma disposição do Papa Inocêncio IV, confirmada por Urbano IV e Bonifácio VIII, segundo a qual na Espanha, durante um sermão publico chamado “auto de fé, com a previa anuência do Bispo, os inquisidores podiam absolver, decretar penas brandas (uma peregrinação substituível por doações), a detenção parcial ou perpetua de um individuo, ou ainda a sua morte na fogueira - pena aplicável também “post mortem” - sendo que estas duas ultimas formas de castigo permitiam o confisco dos bens.
Nesta época o Dominicano Tomás de Torquemada foi nomeado inquisidor geral para a Espanha, e este em 1483 organizou o Tribunal Eclesiástico da Santa Inquisição. A história lembra este senhor pelo seu “rigor” na aplicação das penalidades impostas aos que eram acusados de heresias pelos tribunais da Inquisição.
Entre os que eram acusados de praticar cultos dessemelhantes aos da igreja católica, havia as feiticeiras, ou bruxas, e estas mereciam ser castigadas exemplarmente com a morte porque na bíblia, em Êxodo 22:18 é textualmente dito: “Não deixarás viver uma feiticeira”. Com esta finalidade o papa Inocêncio VIII, no dia quinze de dezembro de 1484, promulgou a bolla papal “Summis desiderantes affectibus”, declarando por este meio aberta a caça às bruxas. Resumo da bolla papal:
Como nos desejamos que a fé católica cresça e floresça no mais alto grau possível, e que todas as heresias e as depravações sejam distanciadas dos países em que moram os fieis, Decretamos: Recentemente chegou aos nossos ouvidos.. que em algumas regiões da Alemanha, como Magonça, Colônia, Treviri, Bremen e Branderburgo, muitas pessoas, de ambos os sexos, ..renegando a fé católica.. dedicaram-se à demônios masculinos e femininos, e que, por causa de seus encantamentos, sortilégios e outras praticas abomináveis... causaram a sua própria ruína, da sua prole, dos animais e dos produtos da sua terra.. assim como de homens e mulheres, de suas criações de animais, de suas vinhas e arvores de fruta, que estes atormentaram e torturaram, infligindo dores horríveis e angustias, seja espirituais como materiais, impedindo aos homens de procriar e as mulheres de engravidar, impedindo, ainda, que os matrimônios se consumassem; mas que, mais grave ainda, estes não confessam suas culpas.. a fé que receberam com o santo batismo... e se mancham alem disso com outros abomináveis crimes e pecados... patrocinando um escandaloso e pernicioso exemplo para as populações.
E, mesmo se nossos diletos filhos Heinrich Kramer Institor e Jacob Sprenger, pertencentes à Ordem dos frades predicadores, professores de teologia, tenham sido por nos nomeados inquisidores da pratica herética através das nossas cartas apostólicas; o primeiro para as mencionadas regiões da Alemanha e o segundo para algumas áreas do vale do Reno; mesmo assim alguns expoentes do clero e do laicato local...porque nas supracitadas cartas de nomeação e nas mencionadas províncias ... as pessoas e as culpas em questão não foram individualizadas ou especificamente indicadas...teimam em exercitar ilicitamente o trabalho de inquisição. A estes é proibido proceder ao aprisionamento, ao julgamento, ou à aplicação das correções ou punições que os hereges merecem.
Fonte: "http://it.wikipedia.org/wiki/Summis desiderantes"

Na Alemanha, como acabamos de ver, foram nomeados inquisidores Heinrich Kramer Institor e Johann Sprenger, recebendo o encargo de “punir” as pessoas que julgassem infectadas pelo vírus de perversão herética. Estes dois frades se dedicaram com tanto ímpeto à empreitada que lhe foi designada, que algum tempo depois escreveram “Malleus maleficarum” (o martelo das bruxas), um manual que descrevia as maldades operadas pelas bruxas para que os inquisidores novatos se transformassem em expert na arte de reconhecê-las, interrogá-las e torturá-las para lhe arrancar uma confissão.
A primeira edição deste manual aconteceu no inverno de 1486 e até 1669 lhe sucederam outras trinta e quatro edições. Ao todo, segundo o que é dito, foram mais de 35 mil copias.
Quantas “bruxas” foram queimadas ou enforcadas por causa destas tolas conceituações é difícil dizer, entretanto, muitos estudiosos afirmam que foram muitos milhares.
É interessante lembrar, para se ter uma idéia exata do absurdo destes crimes, que depois que a igreja católica apostólica romana perdeu seu poder, o dia das bruxas, pouco a pouco, passou a ser comemorado mundialmente com muita alegria.



JESUITISMO
Em 1534 surgiu no cenário do catolicismo romano mais uma pagina negra. O espanhol Inigo Lopez de Recalde, ex-pagem da corte, não podendo mais retornar a esta função por ter perdido a sua aparência física devido aos dois ferimentos que, como militar, recebeu na batalha de Pamplona, adotou o pseudônimo Inácio de Loiola e fundou a ordem dos jesuítas. Para recompensá-lo, foi santificado em 1621 pelo papa Gregório XV.
O juramento dos jesuítas –que pode ser lido no livro “Congressional de Relatórios” na página 3262 - em síntese diz: ”prometo ensinar a guerra lenta e secreta contra os protestantes, maçons, etc. queimar vivos esses hereges, usar o veneno, o punhal ou a corda de estrangulamento... farei arrancar o estomago e o ventre de suas mulheres e esmagarei a cabeça de seus filhos contra a parede a fim de aniquilar a raça “! “Se eu for perjuro, as milícias do papa poderão cortar meus braços e minhas pernas, degolar-me, cortando minha garganta de orelha a orelha, abrir minha barriga e queimá-la com enxofre etc”. Assino meu nome com a ponta deste punhal molhado no meu próprio sangue.
A ordem dos Jesuítas foi repudiada pelo Papa Clemente VII que os chamou de intrigantes, mas foi o Papa Clemente XIV, no dia 31 de julho de 1773, que aboliu a sua ordem. Entretanto, esse não foi o seu fim, porque em 1914 o Papa Pio VII a restaurou afirmando que eram os defensores do papa e o braço direito da igreja.

A Companhia de Jesus, de nefasta memória, não procurava conhecer os meios, para cogitar tão somente dos fins imorais a que se propunha.
Sua ação desdobrou-se por largos anos de treva, nos domínios da civilização ocidental, contribuindo amplamente para o atraso moral em que se encontra o “homem cientifico” dos tempos modernos.
Suas hordas de predomínio, de cupidez e de ambição não martirizaram apenas o mundo secular. Também os padres sinceros sofreram largamente sob sua preponderância nefasta. Tanto assim que, quando papa Clemente XIV tentou extingui-la, em 1773, com seu breve “Dominus ac Redemptor”, exclamava desolado: “Assino minha sentença de morte, mas obedeço à minha consciência.” Com efeito, em setembro de 1774, o grande pontífice entregava a alma a Deus, no meio dos mais horrorosos padecimentos, vitimado por um veneno letal que lhe apodreceu lentamente o corpo.
Fonte: livro “A Caminho da Luz” pelo espírito Emmanuel
e psicografado por Francisco Candido Xavier

(22)-TAXA CAMARAE

O catolicismo, perdido em sua vaidade orgulhosa, ao invés de se enriquecer com os tesouros de humildade e de amor que segundo eles mesmos Jesus havia legado, passou a reclamar para si não só suntuosidade e honrarias, mas prerrogativas acima daquelas que até então eram gozadas por reis e imperadores. Assim, tendo alcançado a mais alta preponderância política - esquecendo que nos quatro Evangelhos havia sido escrito que o Cristo ensinara que o verdadeiro reino não é o deste mundo - tentou até pelos meios mais execráveis tornar-se “o único senhor” deste planeta.
A taxa Camarae é uma lista de preços divulgada no ano de 1513 pelo Papa Leão X -1513 a 1521 - cujo nome era Giovanni dei Médici - com o objetivo de encher o caixa do Vaticano através da venda de indulgências. Em outras palavras, vender o perdão a todos os pecadores que se dispusessem a pagar as altas taxas solicitadas pelo pontífice. De acordo com as respectivas particularizações, como veremos abaixo, não havia delito - por mais horrendo que fosse - que não pudesse ser perdoado pagando o respectivo preço.
1. 67 libras: custo do perdão para o eclesiástico que tivesse cometido pecado carnal com freiras, parentes, ou qualquer outra mulher.
2. 219 libras: custo do perdão para o eclesiástico que além do pecado de fornicação, tivesse pecado contra a natureza ou por bestialidade. Entretanto, se tivesse pecado contra a natureza com crianças ou animais, e não com uma mulher, o preço seria só de 131 libras.
3. 2 libras: custo do perdão para o sacerdote que deflorasse uma virgem.
4. 131 libras: custo do perdão para a religiosa que desejasse ser elevada a dignidade de abadessa depois de ter se entregue a um ou mais homens simultaneamente ou sucessivamente, no interior ou fora do convento.
5. 76 libras: custo do perdão para o sacerdote que desejasse viver em concubinato com uma parente.
6. 27 libras: custo do perdão para cada pecado de luxuria cometido por um leigo. Para os incestos, mais 4 libras.
7. 87 libras: custo do perdão para a mulher adultera que pedisse absolvição para ficar livre de qualquer tipo de processo, alem de ter permissão para prosseguir seus relacionamentos ilícitos. Em caso análogo o marido teria que pagar o mesma soma acrescida de 6 libras se tivesse cometido incesto com seus próprios filhos.
8. 131 libras: custo do perdão, acrescido da segurança de não ser perseguido, pelos crimes de roubo, rapto ou incêndio.
9. 15 libras: custo do perdão para um assassinato simples cometido contra um leigo. Mas se o assassino tivesse cometido mais que um homicídio no mesmo dia, não havia acréscimo.
10. 17 libras: custo do perdão para o marido que tivesse morto a esposa. Mas se a esposa tivesse sido assassinada para casar com outra mulher, haveria um acréscimo de 32 libras. Contudo, se tivesse contratado ajudante para esta tarefa, cada um deles para serem perdoados teriam que pagar 2 libras. Se o marido desejasse o perdão só por maltratava sua esposa, o custo limitava-se a 3 libras.
11. 17 libras: custo do perdão para a mulher que destruísse o filho que carregava em seu ventre, mas se houvesse a colaboração do pai, para este ser perdoado teria que pagar mais 17 libras. Entretanto, se o aborto tivesse sido provocado por pessoas estranhas, o custo seria reduzido em uma libra.
12. 17 libras: custo do perdão para o assassinato de um irmão, irmã, mãe ou pai.
13. 131 libras: custo do perdão para aquele que viesse a matar um bispo ou um prelado de hierarquia superior.
14. 137 libras: custo do perdão para o assassinato de um sacerdote, mas se fossem vários os sacerdotes mortos, mesmo em ocasiões diferentes, o custo do perdão para cada uma destas mortes era de 68 libras.
15. 179 libras: custo do perdão para o bispo ou abade que comete um homicídio através de emboscada, acidente, ou outros meios.
16. 218 libras: custo do perdão para aquele que desejava adquiri-lo com antecipação à data do homicídio que pretendia cometer.
17. 269 libras: custo do perdão para o herético que desejasse se converter. Mas o filho do herético que fora queimado, enforcado ou justiçado de qualquer outra forma, se desejasse se converter e ser perdoado, só tinha que pagar 218 libras.
18. 17 libras: custo do perdão para o eclesiástico que, não podendo pagar seus débitos, desejava livrar-se dos processos que seus credores tinham o direito de mover contra ele.
19. 45 libras: preço da permissão para a instalação de um ponto de venda sob as arcadas das igrejas.
20. 87 libras: custo do perdão para os contrabandistas.
21. 781 libras: custo para consentir que uma cidade permitisse que seus habitantes, incluindo os sacerdotes, frades e freiras, consumassem carne e lacticínios nas datas proibidas.
22. 45 libras: custo para permitir que um frade vivesse com uma mulher.
23. 45 libras: custo para que um apóstata, vagabundo ou coisa que o valha, pudesse viver sem ser importunado.
24. 45 libras: custo para permitir que um religioso viajasse vestindo roupas de leigo.
25. 27 libras: custo para permitir que o filho bastardo de um sacerdote, se o desejasse, tivesse preferência para suceder ao pai na cura.
26. 15 libras: custo para permitir que um bastardo recebesse ordens sagradas e gozasse seus benefícios.
27. 17 libras: custo para que um filho de pais desconhecidos pudesse ser aceito na ordem.
28. 58 libras: custo para permitir que leigos disformes recebessem ordens sagradas e gozassem seus benefícios. Soma idêntica teria que ser paga por um cego do olho direito, enquanto que o do olho esquerdo só teria qu pagar 10 libras. Os estrábicos eram taxados em 45 libras.
29. 310 libras: custo para permitir que os eunucos entrassem na ordem.
30. 131 libras: custo para aquele que, por ter faltado a um juramento, queira se ver livre de possíveis perseguições e da acusação de infâmia.
31. Aquele que por simonia (trafego de coisas sagradas ou venda de bens espirituais) desejasse adquirir um ou mais benefícios, era convidado a procurar os tesoureiros que lhes venderiam, a preços módicos, os direitos desejados.
Fonte: livro “verdades e mentiras da Igreja Católica”
de Pepe Rodriguez (Editores Reunidos 1998).

(21)-CRUZADAS

Quando o monge Pedro o Eremita, na ultima década do XI século, começou a pregar, na Europa, que era o momento de organizar uma “guerra santa” para recuperar Jerusalém das mãos sarracenas, haviam se passado aproximadamente 1000 anos da data em que as tropas romanas haviam destruído aquela cidade. O papa Urbano II concebeu, então, no Concilio de Clermont, a idéia de organizar uma armada poderosa com este objetivo.

Reportando-nos ao século XI, as Cruzadas nos merecem especial referencia, dados os seus movimentos característicos da época.
Desde Constantino, que os lugares santos da Palestina haviam adquirido considerável importância para a Europa ocidental. Milhares de peregrinos visitavam anualmente a paisagem triste de Jerusalém, identificando os caminhos da paixão de Jesus, ou os traços da vida dos Apóstolos. Enquanto dominavam na região os árabes de Bagdá ou do Egito, as correntes do turismo católico podiam buscar, sem receio, as paragens sagradas; mas a Jerusalém do século XI havia caído sob o poder dos turcos, que não mais toleraram a presencia dos cristãos, expulsando-os dali com a máxima crueldade.
Semelhantes medidas provocaram os protestos de todo o mundo católico do Ocidente e, no fim do referido século, prepararam-se às primeiras cruzadas em busca da vitória contra o infiel.
A primeira expedição que saiu dos centros mais civilizados, sob o comando de Pedro, o Eremita, não chegou a ausentar-se da Europa, dispersada que foi pelos búlgaros e húngaros. Todavia, Godofredo de Bouillon com seus irmãos e Tancredo de Siracusa e outros chefes, depois de se reunirem em Constantinopla, demandaram Nicéia, com um exercito 500.000 homens. Depois da presa de Nicéia, apoderaram-se de Antioquia, penetrando em Jerusalém com a palma do triunfo. Ali quiseram presentear Godofredo de Bouillon com a coroa de rei, mas o duque da Baixa Lorena parecia rever o vulto luminoso do Senhor do Mundo, cuja fronte fora aureolada com a coroa de espinhos, e considerou sacrilégio o colocarem-lhe nas mãos um cetro de ouro, quando o Cristo tivera, tão somente, nas mãos augustas e compassivas, uma cana ignominiosa. Depois de muita relutância, aceitou apenas o titulo de “defensor do Santo Sepulcro”, organizando-se logo em seguida as ordens religiosas de caráter exclusivamente militar, como a dos Templários e a dos Hospitalarios.
Os turcos, porem, não descansaram. Depois de muitas lutas, apossaram-se de Odessa, obrigando o papa Eugenio III a providenciar a segunda Cruzada, que, chefiada por Luis VII da França e Conrado III da Alemanha, teve os mais desastrosos efeitos.
Em fins do século XII Jerusalém cai em poder de Saladino. Os príncipes cristãos do Ocidente preparam-se para a terceira cruzada, assinalando-se as vitórias de S. João D´Acre. As lutas no Oriente sucederam-se anos a fio como furações periódicos e devastadores.
A Palestina possuía, até então, os seus recantos maravilhosos de verduras abundantes. A Galileia, era um vasto jardim, cheio de perfume e de flores. Mas tantos foram os embates dos exércitos inimigos, tantas as lutas de extermínio e de ambição, que a própria natureza pareceu maldizer para sempre os lugares que mereciam o amor e o carinho dos homens.
As ultimas Cruzadas foram dirigidas por Luis IX, o rei santo da França que, depois da tomada de Damieta, caiu em poder dos inimigos, pagando fabuloso resgate e vindo a desprender-se da vida terrestre em 1270, defronte de Tunis, vitimado pela peste.
Os mensageiros de Jesus, que de todos os acontecimentos sabem extrair os fatores da evolução humana para o bem, buscam aproveitar a utilidade desses acontecimentos dolorosos. Foi por esta razão que as cruzadas, não obstante o seu caráter anticristão, fizeram-se acompanhar de alguns benefícios de ordem econômica e social para todos os povos. Na Europa a sua influencia foi regeneradora, enfraquecendo a tirania dos senhores feudais e renovando a solução dos problemas da propriedade, conjurando muitas lutas isoladas. Além disso, os seus movimentos intensificaram, sobremaneira, as relações do Ocidente com o Oriente, apenas paralisadas mais tarde, em vista da ferocidade dos turcos e dos invasores mongóis.
Fonte: livro ‘‘A Caminho da Luz “ pelo espírito Emmanuel
e psicografado por Francisco Candido Xavier. “.

As Cruzadas, do ponto de vista do interesse humano, não foram somente expedições militares agenciadas pelo papado com a finalidade de permitir o direito dos peregrinos de ir e vir até o Santo Sepulcro, mas, como veremos, havia muito mais por trás desta idéia: por exemplo, o castigo que a igreja - imitando os exemplos de vingança descritos no velho testamento - julgava que devia aplicar, não somente porque os árabes do seu ponto de vista eram hereges, mas porque estes ousavam invadir seus domínios. Sim, as constantes invasões muçulmanas, e as agressões que praticavam deviam ser respondidas aplicando a lei do olho por olho e dente por dente.
Levítico 26: 14-46 - Mas se não me escutardes e não guardardes os meus mandamentos, se desprezardes os meus preceitos e vossa alma aborrecer as minhas leis, de sorte que não pratiqueis todos os meus mandamentos e violeis minha aliança, eis como vos ei de tratar: enviarei terríveis flagelos sobre vos: a tísica e a febre que empanarão vosso olhar e vos farão desfalecer. Debalde semeareis a vossa semente, porque vossos inimigos a comerão. Voltarei a minha face contra vos e sereis vencidos pelos vossos inimigos: eles vos dominarão, e fugireis sem que ninguém vos persiga. Se nem assim me ouvirdes, castigar-vos-ei sete vezes mais pelos vossos pecados. Quebrarei o orgulho do vosso poder, tornarei o vosso céu como ferro e bronze. Inutilmente se gastará a vossa força, pois vossa terra não dará os seus produtos, e as arvores da terra não produzirão seus frutos. Se me puserdes obstáculos e não quiserdes ouvir-me, ferir-vos-ei sete vezes mais, conforme vossos pecados. Mandarei contra vos as feras do campo, que devorarão vossos filhos etc.
As invasões:
No ano 902 os muçulmanos conquistaram e tomaram a Sicília.
Em 940 tropas muçulmanas assaltaram e destruíram o mosteiro de São Galo, na Suíça.
Trinta e dois anos depois, em 972, outras tropas muçulmanas capturaram e mantiveram como refém o Mônaco de Maiolo - abade de Cluny - figura central do maniqueísmo da época além de ser o conselheiro espiritual e político de duques e Imperadores.
Mais uma vez na Calábria - em 981 - na batalha de Stilo, as tropas muçulmanas destruíram o exercito cristão comandado pelo imperador Romano Ottone I e na região meridional da Itália, por mais de 50 anos, mantiveram um Emirado muçulmano.
Em 997 um outro ataque muçulmano saqueou o mosteiro de Santiago de Compostela na Espanha.
Em 1071, em Manzikert, uma outra grande vitória dos muçulmanos sobre o exercito cristão bizantino, criou um impacto tão grande que persuadiu o imperador do oriente a solicitar ajuda militar ao Papa. Inicia-se assim o mecanismo que leva os cavaleiros às cruzadas. Na contabilidade eclesiástica os mortos eram transformados em mártires e os vencedores eram premiados com o rico botim que conquistavam.
A primeira cruzada, 1096- 1099, em verdade foram duas: a de Pedro o Eremita, que era popular, exterminada pelos húngaros e a outra, poderosamente constituída, conquistou Odessa, Nicéia, Tarso, Antioquia e finalmente Jerusalém, onde Godofredo de Bouillion não aceitou o titulo de rei mas apenas o titulo de “defensor do Santo Sepulcro”.
A segunda Cruzada, 1147-1149, pregada por São Bernardo, foi chefiada por Luis VII da França e Conrado III da Alemanha, mas, em seguida á queda de Odessa em mãos turcas, não teve êxito.
A terceira Cruzada, 1189-1192, pregada depois que o Sultão do Egito, Saladino, esmagou os cristãos em Tiberíades - cidade de Israel na margem ocidental do lago de nome igual - e conquistou Jerusalém, teve dois exércitos; um chefiado pelo imperador romano-germânico Frederico Barba-Roxa que se afogou na Cilícia, o outro pelo rei da França Filipe Augusto que abandonou as cruzadas e regressou ao seu país e por Ricardo Coração de Leão que conquistou Chipre tornando-a um reino Latino.
A quarta Cruzada, 1202-1204, foi empreendida por Bonifácio de Montferrat e Balduino IX de Flandres. Chegados a Veneza foram desviados da sua rota pelos venezianos que lhe impuseram a conquista de Zara e, depois de tomar Constantinopla - devido ao cisma entre Roma e as igrejas orientais - e realizar o monstruoso saque que a história registrou – 1204 - fundaram o Império Latino de Constantinopla que se manteve até 1261.
A quinta Cruzada, 1217-1221, foi organizada por João de Brienne - rei de Jerusalém e por André II - rei da Hungria, mas se limitou a uma incursão infrutífera contra os sarracenos.
A sexta Cruzada, 1228-1229, foi conduzida pelo imperador Frederico II que conseguiu negociar com os muçulmanos um tratado que lhe concedia a posse de Jerusalém por dez anos. Mas a derrota dos cristãos em Gaza -los perder a possessão.
A sétima Cruzada, 1248-1254, foi dirigida por Luiz IX, rei da França, para pagar uma promessa. Depois de ser derrotado em Mansurá, no Egito, devolveu Damieta - a cidade do Egito próximo á costa do Mediterrâneo que havia conquistado- para recuperar sua liberdade.
A oitava Cruzada, 1270, também foi conduzida por Luiz IX. Morreu diante de Tunis – foi santificado - enquanto as cidades da Palestina caiam, uma após outra, em poder dos Sarracenos. A queda de Ptolomeu, em 1291, marcou o fim das cruzadas.
A Cruzada vergonhosa: Ao longo dos 170 anos em que as cruzadas se sucederam, se por um lado havia uma constante necessidade de novos exércitos e comandantes, do outro, buscavam-se avidamente estratégias vitoriosas porque as expedições contra os infiéis - mesmo quando eram coroadas de sucesso – este não era definitivo. Surgiu assim - a historia não esclarece quando ou por quem - à idéia de organizar um exercito de seres simples, humilde como os pobres que haviam conquistado o coração de Cristo em Jerusalém.
Então, alguém encontrou um indivíduo com estas características: chamava-se Stefano e era um pastorzinho de doze anos da cidade de Cloyes. Stefano, em 1212, se apresentou à corte francesa com uma carta que dizia ter recebido diretamente de Jesus? Ela continha a ordem de comandar um exercito de meninos para libertar a terra Santa. “A sinceridade e docilidade dos meninos”, segundo o texto, “seriam as qualidades que os transformaria em vencedores nas regiões em que a experiência dos grandes generais havia falido”. Chegando ao mar, ainda dizia a missiva, as águas se abririam diante deles como se haviam aberto a do mar Vermelho para permitir que os hebreus o atravessassem. Deste modo o exército de crianças alcançaria a terra santa sem ao menos se molhar.
Milhares de crianças responderam ao chamado de Stefano e Nicola - seu par alemão - atraídos pela idéia de uma indescritível aventura fortalecida pela confiança infantil. Seus pais os deixavam partir ou porque estavam convencidos de seu iminente sucesso ou porque partindo haveria uma boca a menor para alimentar.
Não devemos esquecer, no entanto, que naquela epoca no velho mundo um individuo com doze anos já era considerado adulto.
Os dois exércitos partiram para o sul, mas na medida em que terminava o alimento a “energia” dos pequenos soldados de Cristo diminuía de intensidade. A saudade e a fome levavam muitos a desertar e retomar o caminho de casa.
Nicola e a sua tropa germânica chegaram a atravessar os Alpes, mas só uma terça parte do seu pequeno exercito alcançou a Itália. Mesmo assim, atingida á cidade de Genova depois de muitas penas, o mar não se abriu diante deles como havia sido afirmado. Sem outra opção dirigiram-se para Roma, onde, segundo consta, o papa Inocêncio III nada fez para dissuadi-los. Assim, a maioria deles, na ausência de uma proibição, continuaram, mas as água do mar Mediterrâneo mais uma vez permaneceram surdas às suas invocações.
Concomitantemente, o exército de Stefano também alcançara o mar, mas suas suplicas para que os deixasse passar também não foram ouvidas.
Sem perder a fé, porque os padres que os acompanhavam a mantinham acesa, aceitaram a oferta de alguns mercadores que se ofereceram para levá-los em seus navios. Entretanto - depois que as naus desapareceram no horizonte - ninguém mais teve noticias deles. Tempos depois, através dos poucos padres que conseguiram voltar, se soube que as crianças do exercito de Stefano haviam sido vendidas como escravas pelos mesmos mercadores que as haviam embarcado em seus navios.
A cruzada velhaca. Organizada pelo papa Inocêncio III em 1209 e comandada por Simão IV de Monfort, não foi contra os árabes... mas contra os cristãos do ocidente - os chamados hereges de Provença - que nada mais eram do que os cátaros e albigenses já citados, e por extensão contra os cavaleiros Templários.
A historia de Provença começa com as lendas relacionadas à Maria Madalena e, mesmo se estas ultrapassam suas fronteiras, apenas nesta região se podem encontrar os locais associados à sua passagem pela França.
Historias a respeito de Maria Madalena afloram em abundancia por todo o sul da França concentrando-se, particularmente, nas proximidades do sudoeste dos Pirineus e em Areigé, dizendo que foi para esses lugares que ela trouxe o Santo Graal. Como já era de se esperar, essas terras também são morada de grande número de Madonas Negras, em particular nos Pirineus orientais.
“Bem antes das divindades masculinas terem usurpado a religião matriarcal, na época em que se deu o despertar religioso, imperava a religião da Grande Mãe chamada Ishtar, Geia, Ísis - ou com dezenas de outros nomes - que representava a Terra e tinha dois aspectos: um positivo e luminoso, porque representava à fertilidade, a colheita, a abundancia e o ininterrupto ciclo da vida sinalizado pelo nascimento, morte e renascimento, e outro escuro, porque era sinônimo de infertilidade, de carestia e da destruição. Mas é dessa Grande Mãe que derivam todas as virgens negras ou madonnas negras, que segundo alguns são mais de 450 ao redor do mundo” e são cultuadas em inúmeros locais. A padroeira do Brasil, ou seja, a Nossa Senhora Aparecida, pela sua cor, também é uma Madonna negra”.
Seguindo em direção oeste, tendo Marselha atrás de nos, chegamos à região de Languedoc-Roussillon, que já foi à região mais rica da França e hoje é uma das mais pobres. Nessa região despovoada os pensamentos de cada pessoa parecem ecoar sobre a terra reverberando cada vez mais, pouco a pouco, milha após milha, a despeito do numero crescente de turistas que vem sorver sua historia encharcada de sangue e, claro, também do vinho local. E embora nos, como bons europeus, fizéssemos nossa proporia contribuição à economia local, estávamos lá, em primeiro lugar, para examinar o passado.
Em todos os lugares podem-se ver as evidencias da turbulenta historia vivida pela região. Castelos arruinados e antigas fortalezas postas abaixo por ordens de reis e papas, sujam a paisagem e nos falam de brutalidades que ultrapassam até mesmo a propensão medieval de governar por meio da atrocidade. Assim, se existe um lugar na Europa que possa ser lembrado como o lar da heresia esse é Languedoc-Roussillon. E foi esse único fato histórico o responsável pelo empobrecimento sistemático da região. Não levando em consideração regiões como Bósnia e Irlanda do Norte, raramente a religião deixou marcas tão profundas sobre a prosperidade de um país de um modo tão explicito como nessa região.
Antigamente ó Languedoc se estendia da Provença à região entre Toulouse e os Pirineus orientais. Até o século XIII não fazia exatamente parte da França, porque era governado pelo condado de Toulouse que, embora nominalmente devesse submissão aos reis da França, na pratica era, na verdade, mais rico e poderoso.
Nos séculos XI e XII essa região causava inveja a toda a Europa devido a sua civilização e cultura. Sua arte, literatura e ciência eram, sem sombra de duvida, as mais avançadas da época; no século XIII, porem, essa cultura resplandecente foi cortada ao meio pela invasão dos povos bárbaros do norte causando um ressentimento que persiste até hoje. Muitos habitantes ainda preferem chamar a região de Occitanea, seu nome anterior. Essa região, como iríamos descobrir, é dona de uma memória particularmente longa.
O antigo Languedoc sempre foi um berço para idéias heréticas e não ortodoxas, provavelmente porque uma cultura que encoraje a busca de conhecimentos tende a tolerar pensamentos novos e radicais. Uma das principais desse ambiente eram os trovadores, esses menestréis andarilhos cujas canções de amor eram, em essência, hinos dedicados ao principio feminino. Essa tradição voltada para o amor elegante, era centrada na idealização de mulheres e, dentre elas, a mulher ideal, a Deusa. Eles podem ter sido românticos, mas as canções dos trovadores também transmitiam um erotismo real. A influencia do movimento, porem, se estendeu para alem de Languedoc e, em particular, com grande êxito na Alemanha e nos Países Baixos onde os trovadores eram conhecidos como “minnesingers”, literalmente “os cantores de senhoras, embora aqui a palavra tenha o significado de mulher idealizada ou arquetípica”.
O Languedoc assistiu ao primeiro ato de genocídio cometido pelos europeus quando 100.000 membros da “heresia” dos Cataros foram massacrados por ordem do papa durante a Cruzada contra os Albigenses - em razão da cidade de Albi ser uma fortaleza Catara.
A santa inquisição fora originalmente criada para, especificamente, interrogar e exterminar os cátaros. Talvez seja apenas pelo fato da Cruzada dos albigenses ter ocorrido em uma época tão remota quanto o século XIII, que esse massacre nunca tenha tido o mesmo impacto histórico dos holocaustos mais contemporâneos. Porém, muitos habitantes locais ainda sentem o sangue ferver à simples menção desse assunto e alguns até sugerem que houve uma operação oficial de cobertura ao longo dos séculos, uma verdadeira conspiração para impedir que a historia dos cátaros fosse mais amplamente divulgada.
Alem dos cátaros essa região era e sempre foi, um reduto da alquimia e varias aldeias atestam o interesse pela alquimia de seus antigos moradores, notadamente Alet-les-Bains, perto de Limoux, onde as casas ainda são enfeitadas com simbolismos esotéricos Foi também em Toulouse e Carcassonne que surgiram as primeiras acusações conhecidas contra as assim chamadas Bruxas do Sabbath, entre 1330 e 1340. Em 1335 sessenta e tres pessoas foram acusadas de feitiçaria em Toulouse e as suas confissões foram obtidas através dos métodos usuais que sempre garantem que aja uma confissão.
A chefe era uma jovem mulher chamada Anne-Marie de Georgel e essa ao descrever suas crenças parecia falar em nome de todas. Afirmou que viam o mundo como um campo de batalha entre dois deuses, o Deus do Céu e o Deus deste Mundo. Elas apoiavam este ultimo porque acreditavam que ele seria o vencedor. Tal coisa pode ter significado “feitiçaria” para os juizes eclesiásticos, mas, na verdade, era gnosticismo pura e simplesmente. Outra mulher, acusada de crime semelhante, testemunhou ter assistido ao ‘Sabbath’ a fim de servir os cátaros ao jantar.
Muitos elementos pagãos sobrevivem nesta região e podem ser encontrados nos lugares mais surpreendentes. Pois, embora as esculturas do “homem verde”, o deus da vegetação que era venerado na maior parte das regiões rurais da Europa, possam, por um lado ser vistas em muitas igrejas cristãs como a Catedral de Norwich, ele normalmente não é descrito como sendo descendente de uma deidade do Antigo Testamento. Como A.T.Mann e Jane Lyle escrevem.
“Na Catedral de St-Bertrand-de-Comminges, nos Pirineus, Lilith encontrou um jeito de entrar em uma igreja: uma escultura que retrata uma mulher alada, com pés de passaro, que dá a luz uma figura dionisíaca, é verde”.
A mesma cidadezinha afirma ser o local da tumba de ninguém mais e ninguém menos de Herodes Antípas, o governador da Palestina que mandou executar João Batista. De acordo com o cronista hebreu do século I, Josefo, o frágil triunvirato composto por Herodes, sua esposa - a intrigante Herodíada - e a enteada Salomé - que é conhecida pela dança dos Sete Véus, estavam todos exilados na cidade romana de Lugdunum Convenarum, em Gaul, que hoje é St-Bertrand-de-Conuninges. Herodes desapareceu sem deixar rastro, Salomé morreu em um córrego nas montanhas enquanto Herodíada se transformou em lenda local tornando-se líder de um grupo de feiticeiras.
Outra pitoresca lenda de Languedoc se refere à Rainha do Sul - Reine du Midi - um titulo das condessas de Toulouse. No folclore a protetora de Toulouse é La regine Pedauque - a rainha ganso. Isso pode ser uma referencia na cifrada e esotérica “linguagem dos pássaros”, para o Pays d´Oc, mas os pesquisadores franceses identificam essa figura com a deusa Síria Anath que por sua vez está intimamente ligada a Ísis.

Uma outra personagem legendária da região é Meridiana. Seu nome parece ligá-la ao meio-dia e ao sul - ambos midi em francês. Sua aparição mais famosa aconteceu quando Gerbert d´Aurillac - 940-1003 - que mais tarde tornar-se-ia o papa Silvestre II, rumou para a Espanha a fim de aprender os segredos da alquimia. Silvestre, que tinha como oráculo uma cabeça falante, recebeu sua sabedoria desta Meridiana que lhe ofereceu seu corpo, riquezas e a sabedoria da magia, com certeza algum tipo de conhecimento alquímico e esotérico transmitido através de rituais de iniciação sexual.
A escritora e pesquisadora americana Bárbara G. Walker deriva o nome Meridiana de ‘Maria-Diana’, unindo assim essa complexa deusa pagã com a lendária Madalena do sul da França.
Foi também o Languedoc que abrigou, sem duvida nenhuma, a maior concentração de cavaleiros templários na Europa até que fossem suprimidos no inicio do século XIV. A região é toda pontilhada com as evocativas ruínas dos castelos e edificações militares da ordem.
Se, como suspeitamos, existiram muitas outras ramificações do culto herético de Maria Madalena, alem das que encontramos na Provença, então, com certeza, o Languedoc seria o lugar para encontrá-las. Uma das maiores cidades por onde passaríamos, ao viajar pela auto-estrada de Marselha, viu o despertar de incontroláveis paixões em nome dela; e milhares de pessoas haviam sido, de modo horrível, levadas a morte em virtude do significado que ela tinha para eles.
A cidade de Béziers, hoje pertence à província de Hérault, no Langue-dos-Roussillon, é uma cidade populosa a cerca de dez quilômetros do Golfo dos Leões no Mediterrâneo. Em 1209, porem, todos os habitantes da cidade, até o ultimo deles, foram caçados e mortos impiedosa-mente pelos Cruzados que caçavam os albigense. Mesmo para uma cruzada marcada pela quantidade de sangue derramado essa passagem é uma historia particularmente bizarra. Essa historia já foi relatada por vários comentadores contemporâneos, mas aqui nos limitaremos ao relato de Pirre dês Vaux-de-Cemat, um monge de Cister, escrito em 1213. Ele não esteve presente aos eventos mas baseou seu relato nos dos cruzados que lá estiveram.
Béziers tornou-se algo como um reduto para hereges, razão da existência, à época do ataque dos cruzados, de um enclave de 222 cátaros que lá viviam sem serem molestados pela população. Embora não se saiba ao certo se o conde de Béziers seria ele mesmo um cátaro ou apenas um simpatizante o certo é que ele nada fez para perseguí-los ou suprimi-los e isso era o que, em particular, enfurecia os cruzados.
Eles ordenaram aos citadinos - os católicos comuns – quer entregassem os cátaros ou deixassem a cidade para que pudessem lidar com eles com mais facilidade. Apesar dessa exigência ter sido feita sob pena de excomunhão – uma questão de extrema importância para uma época em que o inferno era uma realidade concreta – e a alternativa oferecida parecesse bastante generosa pois representava uma chance de escapar ao iminente massacre - uma coisa surpreendente aconteceu: Os citadinos se recusaram a obedecer a qualquer exigência. Como escreveu dês Vaux-de-Cemat, eles preferiram morrer como hereges em vez de viverem como cristãos. E de acordo com o relatório enviado ao papa por aqueles que o representavam os Citadinos juraram defender os hereges.
Em julho de 1209, então, os cruzados marcharam em direção a Béziers e, sem qualquer dificuldade, tomaram a cidade e mataram todos os que lá estavam: homens, mulheres, crianças e padres e depois atearam fogo ao local. Entre 15.000 e 20.000 pessoas foram mortas: destas, apenas 200 eram heréticas. Nada poderia salvá-las, nem a cruz, nem o altar, nem o crucifixo. Quando os cruzados perguntaram aos delegados do papa como eles poderiam separar os hereges do resto do povo da cidade, receberam a até hoje notória resposta: “Mate-os todos. Deus saberá separá-los”.
Embora seja fácil pensar que os habitantes tenham querido defender sua cidade contra as depredações habituais dos exércitos, chamamos a atenção para o fato de que havia sido oferecida a eles a oportunidade de partirem e se, a manutenção intacta de suas propriedades fosse algo de suprema importância para eles, poderiam simplesmente entregar os hereges aos cruzados e voltar para o cotidiano de suas vidas sem sequer olhar para trás. Porem, escolheram ficar na cidade, assinando, deste modo, a sua sentença de morte. E a reafirmaram ao jurarem lutar em defesa dos cátaros. Mas o que realmente estava acontecendo em Béziers?
Primeiro deve-se levar em conta a data precisa do massacre: era o dia 22 de julho o dia dedicado a Maria Madalena, algo apontado por vários escritores contemporâneos como tendo um significado singular. E foi na igreja de Maria Madalena, em Béziers, que quarenta anos antes o senhor local, Raimond Trencavel I, foi morto, embora não se saiba exatamente o porquê. Em Béziers pelo menos a ligação entre Maria Madalena e a heresia não era meramente acidental e isso nos dá uma visão mais aguçada sobre o pano de fundo da cruzada dos albigenses, como escreveu Pierre des Vaux-de Cernat:
“Béziers foi ocupada no dia de Santa Maria Madalena. Oh!, injustiça suprema da providencia!...Os hereges afirmavam que Santa Maria Madalena era concubina de Jesus Cristo... foi então uma causa justa esses cães asquerosos terem sido massacrados no dia das festividades daquela que haviam insultado”.
Talvez para os bondosos monges e para os cruzados essa idéia possa ter sido um tanto chocante, mas, obviamente, não era para a grande maioria do povo da cidade que tinha escolhido apoiar os hereges até a morte. Está claro que essa crença era uma tradição local extremamente poderosa nos corações e mentes daquelas pessoas. Como já vimos os Evangelhos Gnósticos e outros textos antigos não hesitam em descrever a relação entre Maria Madalena e Jesus como sendo aberta e até publicamente sexual. Mas, como será que essa idéia chegou aos ouvidos desses moradores urbanos da França medieval? Os Evangelhos Gnósticos ainda não haviam sido descobertos - e mesmo que já o tivessem sido – era muito improvável que já tivessem sido disseminados entre eles - Assim, de onde será que veio esta tradição?
A cruzada foi apenas o tiro de partida da guerra contra os albigenses, como um todo, que iria saquear o Languedoc durante mais de quarenta anos, causando cicatrizes tão profundas na psique coletiva das pessoas que não há nada de estranho em afirmar que perduram até hoje. Então, quem eram esses cátaros cujas crenças foram a causa de uma cruzada especialmente organizada para acabar com eles?
Ninguém pode, com alguma segurança, estabelecer a gênese da fé dos cátaros, mas eles rapidamente tornaram-se um poder a ser levado em conta no Languedoc do século XI. Para os languedocianos os cátaros não eram tratados com desdém, ou mesmo considerados ridículos como a nossa própria cultura tende a considerar os cultos religiosos minoritários; ao contrario, eram a religião dominante da região e, localmente, a tratavam com extremo respeito. As famílias nobres da região ou eram reconhecidamente cátaros ou então simpatizantes destes, porque lhes davam um apoio efetivo. O Catarismo era, virtualmente, a religião oficial do Languedoc.
Conhecidos como Les Bonhommes ou Les Chrétiens – os bons homens ou os cristãos - os cátaros aparentemente não ofendiam ninguém. Comentadores contemporâneos, especialmente aqueles que tem uma visão na “nova era”, afirmam que os cátaros representavam um movimento autentico com o intuito de voltar aos fundamentos do cristianismo. Embora, como veremos, tivessem absorvido muitas outras idéias e tivessem uma ideologia própria um tanto confusa, a verdade é que seu modo de vida era uma tentativa de obedecer aos ensinamentos de Jesus. Acusavam a igreja católica de ter se desviado muito do conceito original do cristianismo. Consideravam como anátema a riqueza e a pompa da igreja que viam como o oposto do que Jesus havia pregado a seus seguidores. Vistos de modo superficial poderiam parecer os precursores do movimento protestante, mas, apesar de certas semelhança, não era esse o caso. Os cátaros levavam vidas muito simples. Preferiam passar o tempo ao ar livre ou em casas simples do que em igrejas e embora tivessem uma hierarquia administrativa que incluía bispos, todos os membros batizados eram espiritualmente iguais e considerados padres. Para aquela época o mais surpreendente talvez fosse a ênfase que davam à igualdade entre os sexos, embora a culta região do Languedoc já possuísse uma atitude mais iluminada em relação às mulheres do que era habitual.
Eram vegetarianos que comiam peixes por razões ligeiramente relacionadas à saúde como discutiremos mais tarde. Eram pacifistas e acreditavam em uma forma de reencarnação. Eram também pregadores itinerantes: viajavam aos pares, viviam com simplicidade e em extrema pobreza, parando onde quer que fosse para ajudar e curar os que necessitavam da sua ajuda. De qualquer ponto de vista os “homens bons” não pareciam representar ameaça alguma para quem quer que fosse. No entanto, a igreja encontrou razões suficientes para persegui-los, isso porque ela e os cátaros eram visceralmente antagônicos no que dizia respeito ao simbolismo da cruz porque para eles a cruz era uma lembrança horrível e doentia do instrumento de tortura que levou Jesus à morte.
Tinham também um ódio mortal ao culto aos mortos e ao comercio de relíquias que dele decorria e que constituía um dos principais meios utilizados naquela época para alimentar os cofres de Roma. Mas a principal razão dos cátaros ter caído em desgraça perante a igreja foi à recusa em reconhecer a autoridade do papa.
Ao longo do século XII vários conselhos da igreja condenaram os cátaros, mas só em 1179 eles e seus protetores foram excomungados. Até aquela data a igreja havia enviado os missionários adequados - oradores talentosos - a fim de tentar trazer os languedocianos de volta à “fé verdadeira”, mas estas missões eram recebidas com apatia. Até mesmo o grande São Bernardo de Clairvaux -1090-1153 - foi enviado aquela região apenas para voltar exasperado. Porem, o que é bastante significativo, no relatório que enviou ao papa tomou o cuidado de explicar que embora os cátaros, no que concerne à doutrina caíssem em erro, se fosse examinado seu modo de vida não se acharia nada mais impecável. Essa constatação tornou-se senso comum entre todos os cruzados a ponto de, mesmo sendo inimigos dos cátaros, admitirem que seu estilo de vida era exemplar.
A estratégia seguinte, da igreja, foi tentar bater os hereges em seu próprio campo, e para isso enviaram para a região sua própria versão de pregadores itinerantes. Entre os primeiros, em 1205, estava o famoso Dominic Guzman, um monge espanhol que para lá fora enviado com a missão de fundar a Ordem dos Frades Oradores - mais tarde chamada de Ordem de São Domingos - cujos membros, tempos depois, seriam encarregados dos tribunais da Santa Inquisição.
A partir de então os dois lados viram-se jogados em uma serie de disputas abertas, um tipo de debate em publico terrivelmente serio que nada solucionou. Finalmente, em 1207, o papa Inocêncio III perdeu a paciência e excomungou o Conde de Toulouse, Raymond VI, por não ter entrado em ação contra os hereges. Esse passo era obviamente impopular pois o próprio delegado papal, encarregado de transmitir ao conde essas noticias, foi morto por um dos cavaleiros de Raymond. Essa foi a gota d´ água: o papa convocou uma cruzada contra os cátaros e os que os apoiavam ou com eles simpatizavam. A cruzada se reuniu no dia 24 de julho de 1209 - o dia comemorativo de São João Batista.
Até aquela data todas as cruzadas haviam sido convocadas para lutar contra os muçulmanos, contra os bárbaros estrangeiros que viviam em terras tão distantes a ponto de serem, literalmente, inimagináveis. Mas essa cruzada seria uma guerra de cristãos contra cristãos quase às portas do palácio do próprio papa. Havia, portanto, toda a probabilidade dos cruzados conhecerem pessoalmente alguns hereges que eles haviam jurado exterminar.
A cruzada dos albigenses que começou em Béziers em 1209, prosseguiu com extrema brutalidade, assim, cidade após cidade, caia ante os soldados que estavam sob as ordens de Simon de Montfort. A campanha durou até 1244, um período bastante considerável, durante o qual os cruzados realizaram tudo o que se possa imaginar de pior. Ainda hoje há lugares no Languedoc onde o nome de Simon de Montfort evoca um sentimento misto de medo e abominação.
Na ocasião as razões religiosas tornadas publicas para justificar a campanha logo foram acompanhadas pelos motivos políticos mais cínicos. A maioria dos cruzados viera do norte da França: a riqueza e poder de Languedoc eram atraentes demais para serem ignoradas. No começo da cruzada essa região desfrutava de considerável independência, no final, fazia definitivamente parte da França.
Esse episodio da historia européia foi, sob quaisquer padrões, de significado extremo. Não só fora o primeiro genocídio europeu, como também um movimento crucial para a unificação da França e deu o motivo necessário para a criação da Santa Inquisição. Para nos, entretanto, há muito mais nessa cruzada dos albigenses do que uma campanha plena de atrocidades que, curiosamente, foi relegada ao esquecimento.
Os cátaros eram pacifistas que desprezavam “o imundo invólucro da carne” a ponto de estarem ansiosos por esvaziá-lo, mesmo que os meios necessários para tal significassem o martírio de ser queimado vivo. Durante a campanha muitos milhares de cátaros terminaram seus dias na fogueira e muitos sequer deixaram transparecer o mais leve horror ou medo em face disso. Alguns, aparentemente, chegaram ainda mais longe e não demonstraram sentir dor alguma. Tal feito foi particularmente notável no cerco final ao ultimo refugio dos cátaros: Montségur.
Uma parada essencial para os turistas contemporâneos, Montségur tornou-se um lugar um tanto mítico, bastante similar ao rochedo de Glastonbury. Mas, embora aqueles que estão fora de forma possam achar que este ultimo representa uma subida íngreme e difícil demais, não é nada quando comparado com a estrada que leva ao topo do “château” de Montségur: uma fortaleza de pedra encravada quase que de uma maneira impossível nas alturas vertiginosas de uma montanha escarpada, toscamente parecida com um pão de açúcar, contemplando do alto o povoado e um vale tornado perigoso devido as constantes quedas de pedras. Sinais em vários idiomas advertem contra rompantes no sentido de escalar o château até mesmo por aquele que estão, sem sombra de duvida, no auge de suas forças e forma física: mesmo os andarilhos mais contumazes acham essa trilha particularmente dura. É difícil imaginar como os cátaros e seus suprimentos chegavam até o topo. Uma vez lá, porem, era relativamente fácil imaginá-los tranqüilamente sentados, pois para os cruzados, com sus armaduras e cavalos, nem sequer valia a pena tentar a escalada.

Château de Montségur
Montségur no inicio de 1240havia se tornado o quartel-general dos cátaros remanescentes, quando os cruzados os haviam forçado a recuar até os contrafortes dos Pirineus. Um lar para cerca de 300 cátaros e, em particular, para os lideres principais. Montségur havia se tornado um premio reluzente para os homens do papa. A rainha da França, Blanche de Castilha, reforçou a importância dada a Montségur quando, ao relatar sobre sua captura, escreveu: ’devemos cortar fora à cabeça do dragão’.
Durante os dez meses de cerco a Montségur um fenômeno curioso aconteceu. Vários dos soldados sitiantes desertaram e se juntaram aos cátaros apesar de saberem exatamente como tudo aquilo terminaria, inclusive para eles. O que poderia ter causado tão absurda defecção? Alguns sugeriram que eles ficaram impressionados com o comportamento exemplar dos cátaros, desse modo, foram tomados por uma conversão interna e profunda.
Como já vimos, os cátaros viam a morte através da tortura não só com estoicismo, mas com total tranqüilidade, mesmo quando, dizem, as chamas começavam a dançar em volta deles. Para os que podem se lembrar dos anos 70 vem imediatamente à mente a imagem assombrosa daquele solitário monge budista que se imolou contra a guerra do Vietnã. E permaneceu sentado e ereto, em um transe desenvolvido após longo treinamento e inimaginável disciplina, enquanto o fogo o matava.
Os cátaros estavam conscientemente preparados para a morte, tendo feito até mesmo um juramento que especificamente prometia a submissão de todos à própria fé, em face de quaisquer tipos de tortura. Teriam eles também o conhecimento de uma técnica de transe semelhante que lhes permitisse superar a agonia mais extrema? Com certeza esse seria um segredo que todos os soldados de qualquer época gostariam de conhecer.
Seja como for a queda de Montségur deu vida a muitos mistérios duradouros que foram fonte de fascinação para muitas gerações, inclusive para os nazistas caçadores de tesouro e para aqueles que estavam em busca do Santo Graal. O mistério mais persistente, entre todos, está relacionado com o chamado tesouro dos cátaros, que quatro deles, supostamente, teriam conseguido carregar na noite anterior ao massacre final. Esses intrépidos hereges teriam de alguma forma conseguido escapar descendo por cordas no meio da noite pelo lado mais escarpado da montanha.
Embora formalmente os cátaros tenham se rendido no dia 2 de março de 1244, foi-lhes dada permissão para permanecer na fortaleza durante mais quinze dias por razões que nunca foram bem explicadas: depois deste período eles se dirigiram por vontade própria para a fogueira. Alguns relatos os descrevem como tendo de fato corrido montanha abaixo e pulado para dentro das fogueiras que os esperavam na planície. Especulou-se que eles haviam pedido esse tempo para executar algum tipo de ritual, mas ninguém jamais saberá realmente a verdade sobre isso.
A natureza exata do tesouro dos cátaros é assunto de intensa especulação. Julgando pela rota perigosa percorrida pelos quatro fugitivos, provavelmente não poderiam ter carregado bolsas com pesadas barras de ouro, destarte alguns especulam que era o próprio Santo Graal - ou algum outro objeto ritualístico de grande significado - enquanto outros afirmam que o que eles levavam eram escrituras – conhecimentos - e até mesmo que eram os quatros cátaros, eles mesmo, o tesouro, devido a sua própria importância. Eles poderiam representar uma linha de autoridade, talvez até mesmo encarnando, literalmente, a lendária linhagem sangüínea descendente de Jesus.
Mas se o tesouro dos cátaros fosse na verdade algum conhecimento secreto, qual seria seu formato? No que realmente os cátaros acreditavam? É difícil acessar suas crenças com alguma segurança, porque eles deixaram poucos registros escritos e muito do que é dito sobre suas crenças vem dos documentos de sua inimiga, a Santa Inquisição. E como Walter Birks e R.A.Gilbert sabiamente apontam em seu livro “The Treasure of Montségur” -1987: coloca-se muita ênfase na teologia que lhes é imputada quando, com certeza, seu estilo de vida é o que mereceria mais atenção. Contudo a religião originou-se de uma visão especifica do mundo e essas origens permanecem discutíveis.
Os cátaros eram um ramo dos bogomilos, um movimento herético que surgiu e floreceu em primeiro lugar nos Bálcãs na metade do século X e que se manteve influente na região mesmo depois de os cátaros terem sido destruídos. O Bogomilismo se difundiu amplamente, pelo menos até onde hoje existe a cidade de Constantinopla e foi considerado uma seria ameaça à ortodoxia religiosa.
Os Bogomilos da Bulgária são os herdeiros de uma longa linhagem de heresias, tendo adquirido uma reputação um tanto pitoresca dentre seus oponentes. Por exemplo, a palavra inglesa ‘Bugger’ – sodomita - deriva do nome búlgaro, denotando, literalmente, o significado pejorativo, porque todos os hereges foram acusados de desvio sexual seja esta acusação justa ou não. Para os Bogomilos, assim como para os cátaros, o mundo era mau e o espírito, que era preso em um corpo de imundices, só tinha um meio para se tornar livre, a Gnose, ou seja, a revelação pessoal que conduz a alma à perfeição e ao conhecimento de Deus.
Diante do tipo de literatura a respeito do catarismo disponível em muitas lojas turísticas do Languedoc, são passiveis de perdão aqueles que pensam que esse era um tipo de religião da Nova Era com uma teologia clara e simplista. Há dúzias de livros e folhetos que celebram o humanitarismo e as crenças dos cátaros inseridos nos conceitos modernos como reencarnação e vegetarianismo. Em geral, porem, esta é uma tolice sentimental. Os cátaros praticavam o vegetarianismo não porque amavam os animais, mas sim devido ao ódio que devotavam á procriação e só comiam peixe porque acreditavam, erroneamente, que a reprodução destes era assexuada. Por outro lado a noção que tinham da reencarnação baseava-se no conceito do bom final – morte - que normalmente significava ser martirizado em razão da própria fé. Se se deparassem com tal fim não haveria nenhuma duvida de que não reencarnariam mais neste desprezível vale de lacrimas; porém, se assim não fosse, então voltariam até que fizessem isso direito.
Alguns tentaram argumentar que o catarismo era um produto restrito ao Languedoc: esse argumento é manifestamente impreciso, embora tenha incorporado material típico da região para a construção de sua teologia. Uma coisa que era unicamente dos cátaros era a crença de que Maria Madalena foi mulher de Jesus ou então sua concubina. Julgava-se, porem, que esse conhecimento não era apropriado para todos os cátaros, e devido a isso era restrito ao circulo das lideranças.
Os cátaros não só eram visceralmente contra o sexo, mas até mesmo contra o matrimonio porque este era sinônimo de sexo, por este motivo não teriam como entender o relacionamento que segundo os evangelhos apócrifos existia entre Jesus e Maria Madalena. Alias, retornando a Constantino I e ao Concilio de Nicéia, como um “homem igual a todos os demais homens” poderia ser filho de Deus? Portanto, se existissem documentos que afirmassem que o Filho do Homem era similar a todos os demais homens estes deviam ser queimados e esquecidos, pois se assim não fosse como a substancia do Pai poderia ser igual ao Filho? E a “santíssima trindade” então- a igualdade entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo – considerando todas as discussões dentro e fora dos Concílios que haviam sido necessárias para estabelecê-la?
Os cátaros se encontravam freqüentemente em uma posição teológica delicada porque se por um lado eles encorajavam seus seguidores a lerem a Bíblia - contrastando com o catolicismo ortodoxo que se opunha ao acesso popular á Bíblia - pelo outro tomavam a atitude radical de reinterpretar os eventos bíblicos a fim de ajustá-los às suas próprias crenças. O principal exemplo de suas reinvenções do Novo Testamento é a visão que tinham da crucificação: afirmavam que um Jesus de puro espírito é que fora pregado à cruz. Embora não haja nenhuma evidencia bíblica sobre isso, eles se viram obrigados a inventar esse outro Jesus em razão da repugnância que tinham do corpo físico e, portanto, um crucificado corpóreo era inconcebível para eles.
Desta forma a idéia de Jesus e Maria Madalena serem parceiros sexuais não poderia ser resultado de algum tipo de pensamento tendenciosos. Na realidade eles se engalfinhavam com varias justificativas teológicas diferentes na tentativa de explicar o matrimonio, algo em que não empregariam tanto tempo e energias se sentissem que poderiam simplesmente desconsiderar a historia toda como sendo um completo absurdo. O que isso parece indicar é a prevalência, no Languedoc dessa época, da idade do relacionamento de Jesus com Madalena. Isso não apenas era parte daquilo que as pessoas comuns acreditavam sem qualquer questionamento, como também era algo central para o mundo cristão daquela região como um todo, a tal ponto, que era melhor tratar abertamente do assunto do que tentar ignorá-lo. E como escreve Yuri Stoyanov.
“O conhecimento de Maria Madalena como a mulher ou concubina de Cristo parece ser, além de tudo, uma tradição original dos cátaros que não encontra nenhuma contraparte nos doutrinas dos bogomilos”.
Embora Madalena fosse, e ainda seja, uma santa curiosamente popular na Provença, onde se supões que tenha vivido, foi no Languedoc que ela se tornou o centro de convergência para as crenças abertamente heréticas, e, como iremos descobrir, foi também nessa região que essas mesmas crenças deram origem a paixões surpreendentes, rumores bárbaros, e obscuros segredos.
Como já vimos à idéia de Jesus e Maria Madalena serem amantes também pode ser encontrada nos Evangelhos de Nag Hammadi que foram escondidos no Egito no IV século. Seria então razoável imaginar que as semelhanças com as crenças de Languedoc se originassem daqueles ou de uma fonte em comum? Alguns eruditos, com destaque para Marjoire Malvern, têm especulado que o culto do sul da França a Madalena preservou essas antigas idéias gnósticas. E há alguma evidencia de que seja realmente esse o caso.
No ano de 1330 um tratado extraordinário intitulado “Schwester Katrei” - irmã Catarina - foi publicado em Estrasburgo, supostamente escrito pelo místico alemão Meister Eckhart. Os eruditos, porem, concordam que o verdadeiro autor era uma das suas seguidoras. Esse livro apresenta uma serie de diálogos entre a “Irmã Catarina” e seu confessor sobre a experiência religiosa de uma jovem mulher e, embora incorpore muitas idéias ortodoxas, também mostra varias outras que decididamente não o são. Um exemplo é essa declaração: Deus é a Mãe Universal.
A esse respeito tomamos a liberdade de lembrar que não é necessário ter um Q.I muito desenvolvido para concluir que a “Essência Inteligente Universal” a “ Força Criadora do Todo” que as primeiras religiões chamavam “Mãe”, somente se tornou-se “Pai” quando o profeta Abrão o chamou Jhwh. Contudo o sexo – seja feminino ou masculino - em verdade a maquininha de reprodução, só é necessário para que os animais – racionais ou irracionais - se reproduzam, que não é o caso “Do Ser” que do nada criou o todo. De onde se deduz que “Deus ou Deusa” são apenas meras expressões humanas forçadas pelas limitações das línguas que são utilizadas ao redor do mundo.
Esse tratado franco e incomum une Madalena a Minne, a Senhora do amor dos minnesinger, e, ainda mais estimulante, deu o que pensar aos eruditos porque contem idéias sobre Maria Madalena que só são encontradas nos Evangelhos de Nag Hammadi: ela é descrita como sendo superior a Pedro devido à maior compreensão que tem de Jesus, e há aqui a mesma tensão entre Maria e Pedro. Alem disso, incidentes realmente descritos nos textos de Nag Hammadi são mencionados no tratado da Irmã Catarina.
A professora Bárbara Newman, da Universidade da Pensilvânia, destaca o dilema acadêmico da seguinte forma: “a utilização desses temas na ”Irmã Catarina” coloca uma questão espinhosa no que tange a transmissão histórica” e confessa que isso é um fenômeno real, mesmo sendo desconcertante.
Como poderia o autor de Irmã Catarina, em pleno século XIV, ter tido acesso a textos que só seriam descobertos no século XX? Não pode ser mera coincidência o tratado mostrar a influencia dos cátaros e trovadores do Languedoc, e a conclusão obvia é que foi através deles que os conhecimentos que posteriormente foram ratificados pelos Evangelhos Gnósticos - relativos a Maria Madalena - foram transmitidos; seus segredos podem não só estender-se sobre o que conhecemos hoje como os textos de Nag Hammadi, mas a outros documentos semelhantes, e de igual valor que, contudo, ainda não foram encontrados.
É interessante que haja uma crença duradoura no sul da França sobre a natureza sexual da relação entre Madalena e Jesus. A pesquisa inédita de John Saul revelou muitas referencias na literatura do sul da França - do século VII – a respeito de tal união, especificamente nas obras de homens que estavam associados ao Monastério de Sion, como Cezar, o filho de Nostradamus, cuja obra foi editada em Toulouse.
Tínhamos visto em Proença que onde quer que houvesse centros de culto a Maria Madalena, havia, normalmente, locais associados a João Batista. Como os cátaros pareciam tê-la em alta conta, então talvez eles também demonstrassem a mesma reverencia para com o Batista. Muito pelo contrario, porem, os cátaros pareciam sentir total repugnância para com o Batista a ponto de descrevê-lo como sendo um demonio. Essa repugnância vem diretamente dos bogomilos, porque alguns destes se referem a ele – mesmo se de um modo um tanto confuso - como o precursor do ante-Cristo’.
Um dos poucos textos santos remanescentes dos cátaros é o Livro de João - também conhecido como “Líber Secretum” - que é uma versão Gnóstica do Evangelho de um João completamente diferente: grande parte é exatamente igual ao Evangelho canônico, porém, contem algumas revelações extras pretensamente dadas pessoalmente a João, o “discípulo amado”. Foram essas idéias de caráter dualista e Gnóstico que concorreram para a formação teológica geral dos cátaros.
Nesse livro Jesus diz a seus discípulos que João Batista, na verdade, era o emissário de Satanás -o Deus do mundo material - enviado com o intuito de antecipar-se à sua missão redentora. Esse texto era originalmente dos bogomilos e não foi totalmente aceito nem pelos cátaros nem por todos os bogomilos. Muitos membros de outras facções dos cátaros se entretinham com idéias bastante mais ortodoxas sobre João e existem sinais de que, na verdade, os bogomilos dos Bálcãs realizavam um ritual comemorativo todo 24 de junho.
O certo é que os cátaros tinham uma consideração especial para com o Evangelho de João, que no geral é tido pelos eruditos como sendo o mais gnóstico dos textos do Novo Testamento. Em círculos ocultos vicejam rumores de que os cátaros tinham uma outra versão, hoje perdida, do Evangelho de João. Muitos ocultistas vasculharam a região ao redor de Montségur na esperança de encontrá-los, sem sucesso porem.
Está claro que os cátaros tinham idéias pouco ortodoxas, mesmo que um pouco confusas, sobre João Batista. Mas havia alguma coisa de verdadeiro em seu conceito de um João mau e um Jesus bom? Talvez não muito, mas, como sugerem vários comentadores contemporâneos, a relação entre esses dois homens pode não ter sido tão claramente definida quanto a maioria dos cristãos é levada a acreditar. Essa idéia dos cátaros pode representar o caráter dualista de sua filosofia do modo mais simplista possível: um dos dois é o bem e o outro é o mal. Nesse caso, entretanto, a conclusão lógica é que eles os consideravam iguais, porem opostos. Os cátaros, portanto, deviam vê-los como rivais, o que não é de forma alguma uma visão cristã tradicional. E isso demonstra que duvidas desconcertantes sobre o suposto apoio de João à missão de Jesus já existiam há muito tempo naquela região. Assim como a relação Madalena com Jesus a de João e Jesus parece compreender uma versão radicalmente diferente daquela ensinada pela igreja.
Buscar nos cátaros uma confirmação da importância da figura de João para os movimentos heréticos é trilha certa para a decepção, ao menos superficialmente.
Mas há uma organização historicamente muito significativa, que mais do que contrabalança esse desapontamento. Estamos falando, é claro, dos cavaleiros templários, para quem João Batista sempre foi, inexplicavelmente, objeto de grande devoção. E, do mesmo modo que a cruzada contra os cátaros deixou uma marca traumática indelével na paisagem do Languedoc, os castelos desses cavaleiros enigmáticos, nessa e em outras regiões, continuam expondo, ao longo do tempo, as mesmas marcas indeléveis e traumáticas.
Hoje os templários se tornaram uma espécie de clichê esotérico, como bem sabe qualquer um que esteja familiarizado com a ficção de Umberto Eco, e a maioria dos historiadores não sentem nem um pingo de remorso sequer ao tratar com absoluto desdém qualquer coisa que chame atenção para seus segredos. No entanto, qualquer mistério que esteja conectado com o Monastério de Sion, também envolve esses monges-guerreiros, e, portanto, são umas partes inerentes desta investigação.
Um terço de todas as propriedades dos templários na Europa se encontrava no Languedoc. Suas ruínas contribuem para tornar ainda mais bela essa região selvagem. Uma das lendas locais mais pitorescas é a de que todo 13 de outubro que caia em uma sexta feira - o dia do mês e da semana em que a Ordem foi suprimida de forma súbita e brutal - faz com que apareçam luzes estranhas nas ruínas, alem de negras figuras que podem ser vistas se movendo dentro delas. Infelizmente, nas sextas feiras que passamos naquela região, não vimos nem ouvimos nada alem do alarmante grunhido dos javalis selvagens. Ao menos essa historia demonstra o quanto os templários se tornaram parte da lenda local.
Os templários mantiveram-se vivos na memória dos habitantes locais através de recordações que não são de forma alguma negativas. Mesmo em nosso século ainda encontramos vestígios que atestam isso, como nos conta a famosa cantora de opera Emma Calvé, nascida na região de Aveyron no norte de Languedoc. Emma registrou em suas memórias que o povo local, quando queria dizer que um menino era especialmente bonito ou inteligente, usava o seguinte dito popular: “ele é um verdadeiro filho dos templários”.
Os principais fatos relativos aos cavaleiros templários são bastante simples. Era uma ordem oficialmente denominada “Ordem dos Cavaleiros Pobres do Templo de Salomão”, formada em 1118 pelo nobre francês Hugues de Payens, para servirem de escolta aos peregrinos que se dirigiam a Terra Santa. O grupo, entretanto, nos primeiros nove anos era de apenas nove cavaleiros. Quando a Ordem foi reconhecida oficialmente, logo se transformou em uma força que passou a ser levada em consideração não só no Oriente Médio, mas também em toda a Europa.
Depois do reconhecimento da Ordem o próprio Hugues de Payens empreendeu uma viagem pela Europa solicitando à realeza e á nobreza a doação de terras e dinheiro. Depois, em 1129, visitou a Inglaterra e nesse país fundou a primeira sede dos templários no lugar onde hoje se encontra a estação Holborn do metrô londrino.
Como os demais monges, os cavaleiros também fizeram votos de pobreza, castidade e obediência. Mas eles eram homens do mundo e assim, empunhavam sua espada sempre que se tornava necessário lutar contra os inimigos de Cristo. A imagem dos templários vinculou-se de forma inseparável à das cruzadas que foram organizadas para expulsar o infiel de Jerusalém para mantê-la cristã.

O conselho de Troyes reconheceu oficialmente os templários como uma ordem religiosa e militar em 1128. A figura principal por trás dessas operações era Bernard de Clairvaux, o cabeça da Ordem de Cister, que tempos depois seria canonizado. Mas como escreve Bamber Gascoigne:
Ele era agressivo e abusivo...e era um político trapaceiro e sem escrúpulo nos métodos que utilizava a fim de derrubar seus inimigos.
Foi Bernard que escreveu a regra dos templários baseada na dos cistercienses, e foi um de seus protegidos, na posição de papa Inocêncio II, quem declarou, em 1139, que os templários dali em diante só responderiam diretamente ao papado. Como os templários e a Ordem de Cister desenvolviam-se em paralelo, podemos inferir que havia uma certa e deliberada coordenação entre eles. Por exemplo, o Conde de Champanhe, senhor de Hugues de Payens, doou a Bernard as terras de Clairvaux onde ele construiu seu império Monástico. E é bastante significativo que André de Montbard, um daqueles nove Cavaleiros que fundaram a ordem, fosse tio de Bernard. Chegou-se a sugerir que os templários e cistercienses agiam em comum acordo, obedecendo a um plano pré-determinado, para assumir o domínio sobre a cristandade, mas o esquema não vingara.
Dificilmente exageraríamos ao falarmos do prestigio e do poder financeiro dos templários no período em que sua influencia na Europa estava no auge. Praticamente não havia nenhuma área civilizada importante onde eles não tivessem uma preceptoria, como atestam, por exemplo, vários locais espalhados pela Inglaterra como o Templo da Fortuna, o Templo da Barra – Londres - e o Templo das Pradarias – Bristol. Porem, à medida que seu império se espalhava, crescia também sua arrogância o que fez com que suas relações com as autoridades principais começassem a se degenerar.
A riqueza dos templários em parte resultava da sua tradição: todos os novos membros deviam entregar suas propriedades à Ordem, além disso, amealhavam uma fortuna considerável por meio de volumosas doações de terra e dinheiro de muitos reis e nobres. Seus cofres logo ficaram abarrotados, mas também porque haviam desenvolvido uma impressionante astúcia financeira: na pratica se tornaram os primeiros banqueiros internacionais e suas avaliações de credito tornaram-se um parâmetro para todas as instituições financeiras. Com certeza esse era um meio seguro para se estabelecerem como um dos principais centros de poder. Em um período bastante curto o titulo de “Cavaleiro dos Pobres” tornou-se uma piada, embora seus soldados permanecessem bem pobres.
Alem de sua incrível riqueza os templários também eram conhecidos por sua habilidade e coragem no campo de batalha, chegando às vezes a serem até temerários. Tinham regras especificas que determinavam sua conduta como combatentes; era-lhes, por exemplo, proibido de render-se, a menos que o inimigo estivesse em vantagem numérica de pelos menos três para um, e mesmo assim deviam antes obter a permissão de seu superior. Eles eram os Serviços Especiais daquela época, uma tropa de elite com Deus - e o dinheiro - ao seu lado.
Apesar de todos os esforços a Terra Santa foi dominada pelos sarracenos, pedaço por pedaço, até que, em 1291, o ultimo território ainda em poder do mundo cristão - a cidade de Acre - foi tomada por mãos inimigas. Não havia mais nada que os templários pudessem fazer a não ser voltar à Europa e planejar a eventual reconquista de Jerusalém. Infelizmente, porem, até mesmo a motivação para uma campanha como essa havia desaparecido da mente dos vários reis que poderiam financiá-la. A principal razão de sua existência havia se reduzido a um grande nada. Desempregados, mas ainda ricos e arrogantes, os Templários tinham contra si um ressentimento generalizado, pois estavam isentos de tributação e deviam submissão apenas ao papa. Por estas razões, inevitavelmente, em 1307 caíram em desgraça. Foi o todo poderoso Rei francês, Filipe o Belo, que começou a orquestrar a queda dos templários, diga-se de passagem, com a devida conivência do papa, que de qualquer forma era alguém que o rei Filipe tinha no bolso. Foram emitidas ordens secretas aos representantes aristocráticos do rei e os templários foram reunidos numa sexta feira - dia 13 de outubro de 1307 - presos, torturados e queimados.

Pelo menos é essa a historia que se conta na maioria das obras relativas a esse assunto. Essas obras nos levam a entender que a Ordem, toda ela, conheceu sua horrível destruição final naquele exato dia, e que os templários foram efetivamente varridos da face da terra para sempre. Contudo, a verdade não é absolutamente esta.
Para começar, apenas alguns poucos templários foram de fato executados, embora a maioria dos que foram capturados fossem “submetidos a interrogatório”, um bem conhecido eufemismo para designar uma tortura excruciante. Relativamente poucos enfrentaram a fogueira, embora o Grão Mestre Jaques de Molay tenha sido queimado lentamente, até a morte, na “Ilé de la Cité” à sombra da Catedral de Notre-dame em Paris.

Dos outros milhares de templários apenas os que se recusaram a confessar ou renegaram suas confissões foram executados. Mas que validade poderiam ter estas confissões obtidas através de ferro em brasa e do aperto de parafusos das máquinas de tortura? E o que exatamente era esperado que confessassem?
O relato das confissões dos templários são bastante pitorescas, para dizer o mínimo. Lemos que eles adoravam um gato, se compraziam em orgias homossexuais como parte de seus deveres cavalheirescos, veneravam um demonio conhecido como Baphomet e/ou uma cabeça decapitada. Também foi dito que eles haviam pisoteado e batido na cruz em um ritual de iniciação. Tudo isso, é claro, era para fazer parecer um total absurdo a idéia de que eles eram Cavaleiros dedicados a Cristo, verdadeiro sustentáculo do ideal cristão. Quanto mais eles eram torturados, mais aparente ficava esta divergência.
Isso não causa surpresa: não são muitas as vitimas de tortura que conseguem retesar os próprios dentes e recusar-se a concordar com as palavras que são colocadas em sua boca por seus algozes. Nesse caso, contudo, existem muito mais coisas do que parece haver à primeira vista. Por um lado houve insinuações de que todas as acusações levantadas contra os templários eram fraudulentas, manipuladas por aqueles que invejavam sua riqueza e exasperavam-se com o poder que eles detinham. Estes, então, tramaram uma boa desculpa para que o rei francês pudesse se livrar das dificuldades econômicas vigentes, apropriando-se da enorme riqueza dos templários. Por outro lado, embora as acusações pudessem não ser estritamente verdadeiras, existem evidencias de que os templários estavam metidos com algo misterioso, talvez algo “negro” no sentido oculto do termo. Claro está que essas duas visões não são, necessariamente, mutuamente exclusivas.
Muita tinta já foi gasta com argumentações sobre as acusações feitas contra os templários e as conseqüentes confissões. Teriam eles realmente cometidos todos os atos que confessaram, ou os inquisidores inventaram previamente as acusações e, então, simplesmente torturaram os cavaleiros até que eles concordassem em confessá-las? Alguns cavaleiros, por exemplo, testemunharam afirmando que haviam dito que Jesus era um “falso profeta”. É impossível adotar conclusivamente qualquer das hipóteses.
Há, entretanto, ao menos uma confissão em particular que nos faz parar e refletir. É a confissão de um certo Fulk de Troyes, que disse que os templários lhe mostraram um crucifixo e lhe disseram: “Não coloque tanta fé nisso, pois é algo muito recente”. Parece haver pouca probabilidade dessa declaração enigmática ter sido formulada por um inquisidor dada a pouca educação histórica vigente na época.
É certo que o Monastério de Sion afirma ser o poder criador que estava por trás do surgimento dos cavaleiros templários: se esse é o caso, então esse é um dos segredos mais bem guardados da historia. Mesmo assim, dizem que as duas ordens eram virtualmente a mesma até o momento do cisma em 1188, depois do qual seguiram caminhos separados. E na verdade parece ter havido algum tipo de conspiração relacionada com o surgimento dos templários. O bom senso sugere que deve ter sido necessário mais do que os nove cavaleiros originais para proteger e prover refugio a todos os peregrinos que iam visitar a Terra Santa e ainda por cima durante nove anos; alem disso, há muito pouca evidencia de que eles tenham feito qualquer tentativa seria de realizar tal escolta. Os templários logo se transformaram nos queridinhos da Europa, tendo recebido privilégios e honras totalmente desproporcionais em relação ao que realmente mereciam. Por exemplo, foi-lhe concedido uma ala inteira do palácio real, em Jerusalém, um lugar que antes fora uma mesquita. Por sua vez foi dito, erroneamente, que tal palácio havia sido construído sobre as fundações de Templo de Salomão de onde os templários tiraram seu nome oficial.
Outro mistério relacionado aos inícios dos templários centra-se no fato de haver evidencias de que a Ordem de fato já existia bem antes de 1118, embora o motivo da data ter sido falsificada permaneça obscuro. Muitos comentadores sugeriram que o primeiro relato conhecido sobre a criação dos templários - de Williams de Tiro - que escreveu há cerca de cinqüenta anos após o evento, é simplesmente um historia para despistar. (embora Williams fosse profundamente hostil aos templários, presume-se que ele estava recontando a historia conforme seu entendimento.) Uma vez mais, porem, podemos apenas especular sobre qual era o motivo para tal tentativa de despistamento.
Hugues de Payens e seus nove companheiros vieram todos de Champanhe ou, inclusive, do Languedoc, condado de Provença, e é certos que eles foram a Terra Santa com uma missão especifica em mente. Talvez, como já se sugeriu, estivessem a procura da Arca da Aliança ou de algum outro tesouro antigo, ou mesmo de documentos que pudessem conduzi-los a isso ou a algum tipo de conhecimento secreto que lhes desse domínio sobre as pessoas e suas riquezas. Recentemente, Cristopher Knigth e Robert Lomas, argumentaram em seu livro “The Hiram Key” que os templários buscaram e encontraram o esconderijo de documentos que tinham a mesma origem dos Manuscritos do Mar Morto. No entanto, tão intrigante quanto possa ser tal sugestão, ela não fornece qualquer evidencia convincente e, como veremos, a questão relacionada às origens dos Manuscritos do Mar Morto está repleta de concepções erradas e míticas. Existe, porem, evidências reais de que os templários buscavam obter novos conhecimentos dos árabes e dos outros povos que encontravam em suas viagens.
Para nós uma das coisas mais fascinantes sobre os templários é a forte e incomum reverencia a João Batista, que parece ser para eles muito mais importante do que teria sido um mero santo protetor. O Monastério de Sion, que como é afirmado foi a origem dos templários, chama todos os seus Grão-Mestres de ‘João’, quem sabe se em reverencia a Batista. No entanto, é totalmente impossível descobrir a razão de tal submissão, por parte dos templários, em quaisquer das obras a eles dedicadas; a explicação habitual é a de que João lhes era especial por ter sido professor de Jesus. Alguns sugeriram que a cabeça decapitada que alguns afirmam ter sido fonte de veneração dos templários era a do próprio Batista. Porem, tal adoração a um totem como esse implica em ver os templários como sendo algo muito diferente do que simples cavaleiros cristãos.
Até mesmo muito de seu simbolismo, aparentemente ortodoxo, esconde especificas insinuações a ‘João’. Por exemplo, o Cordeiro de Deus era uma de sus imagens mais importantes. A maioria dos cristãos o toma como sendo Jesus - porque João Batista teria dito referindo-se a ele: ‘Eis o Cordeiro de Deus’ – mas em muitos lugares, como as partes ocidentais da Grã-Bretanha, esse símbolo é utilizado como referencia ao próprio João e para os templários também parece ser esse o significado, porque o símbolo Cordeiro de Deus foi adotado pelos templários em seu selo oficial; esse selo era especifico da Ordem no sul da França.
Uma pista de que a reverencia dos templários para com João Batista não era uma simples questão de prestar homenagem ao seu santo protetor, mas que na verdade ocultava algo muito mais radical, pode ser encontrada na obra de um padre erudito chamado Lambert de St Omer. Lambert estava associado a Godefroi de St Omer, um dos nove cavaleiros fundadores e o segundo em comando das forças de Hugues de Payens. Em “The Hiram Key”, Christopher Knight e Robert Lomas, reproduzem uma ilustração de Lambert retratando a celestial Jerusalém, e observam que ela:
“...aparentemente mostra o fundador [da celestial Jerusalém] como sendo João Batista. Não há nenhuma menção a Jesus nesse, assim chamado, documento cristão”.
Como no simbolismo das pinturas de Leonardo, a conclusão é que João, o Batista, é importante por si mesmo, e não meramente em decorrência de seu papel como precursor de Jesus. Dois anos depois das prisões em massa, enquanto os cavaleiros ainda estavam sendo julgados, o catalão visionário e ocultista Ramon Lull - 1232-1316 - anteriormente um leal partidário da Ordem, escreveu que os julgamentos revelavam as “ameaças à barca de São Pedro”, e acrescentou: Existem, talvez, muitos segredos no cristianismo, dentre os quais há um, em particular, capaz de causar uma incrível revelação, assim como aquele que está emergindo através dos templários...tal publica e manifesta infâmia pode por si mesma colocar em perigo a barca de São Pedro.
Lull parece não só estar se referindo aos perigos para a igreja causados pelas revelações sobre os templários, como também a outros segredos, de igual magnitude. Ele também parece aceitar as acusações levantadas contra a Ordem, embora, aquela altura dos fatos, não fosse uma idéia muito inteligente colocá-la em questão.
Poderia o Languedoc - que foi o local de maior concentração de templários na Europa - fornecer alguma pista que nos levasse à verdade sobre a Ordem? Ainda hoje, após tanto tempo, essa região conta com muitas recordações persistentes e continua a ser saudavelmente desatenta em relação ao convencional.
Como vimos, os cátaros e os templários floresceram aqui e ao mesmo tempo, mas posto o que geralmente é entendido como seus valores relativos, parece que estes dois grupos altamente influentes deveriam estar em lados opostos. Realmente, a cruz vermelha sobre um fundo branco - símbolo dos templários - é com freqüência vista como um símbolo tipicamente pertencente às cruzadas. Porém, existem muitas indicações de que os templários eram, senão ativamente apoiados, vistos com certa simpatia pelos hereges das montanhas e é incontestável que os templários se notabilizaram por sua ausência na cruzada dos Albigenses.
Os cavaleiros admitiam abertamente que seu interesse primário, na ocasião, estava na longínqua Terra Santa, alem de muitos deles terem saído das mesmas famílias que os cátaros, mas nenhuma dessas razões pode explicar totalmente a falta de interesse dos templários em sair ao encalço dos cátaros.
Quais eram, porém, os verdadeiros interesses e motivações dos templários? Eles eram apenas os monges-guerreiros que afirmavam ser, ou havia algo de secreto em seus planos, uma outra dimensão oculta?
A corrente acadêmica afirma que idéias “ocultistas” sobre os templários são apenas tolices: a maioria dos historiadores atesta que eles eram apenas tão somente os monges-guerreiros que afirmavam ser, e qualquer insinuação que se faça de que eles estavam, mesmo que remotamente, envolvidos em qualquer coisa esotérica é resultado de fértil imaginação ou de pesquisa mal desenvolvida. Sendo isso um consenso, os historiadores que tem algum interesse nesse aspecto da Ordem não o demonstram abertamente por temerem perder sua reputação - e os fundos de pesquisa acadêmica. Tal tipo de pesquisa ou é evitada ou, se levada a cabo, permanece inédita. Há vários historiadores de renome que reservadamente reconhecem que o aspecto esotérico dos templários é importante, mas nunca o dirão publicamente.
Essa atitude fez com que se negligenciasse o estudo de alguns locais importantes relacionados com os templários. E descobrimos que a região que foi a maior vitima desse fenômeno, a um grau que beira a mistificação, é a área de nosso maior interesse; O Languedoc-Roussillon. Sem contar a Terra Santa, essa era a pátria da Ordem. Mais de 30 por cento de todas as fortalezas e edificações templárias em toda a Europa ficavam nessa pequena região. Contudo, apenas um volume desprezível de trabalho arqueológico foi lá realizado e existem varias localizações importantes que não mereceram qualquer investigação.
Felizmente a negligencia oficial é contrabalançada por muitos pesquisadores privados que tem um interesse apaixonado por estes misteriosos cavaleiros, e muito dos moradores locais vêem como seu dever preservar e proteger os antigos locais relacionados com os templários. Há também vários amadores - no sentido de que eles não são bancados por fundos de pesquisas - e organizações de pesquisa como o Centro de Estudos e Pesquisa dos Templários, dirigido por Georges Kiess, em Espéraza – Aude - de excelente qualidade. As descobertas feitas por estes entusiastas, através do estudo tanto dos locais quanto dos documentos relativos aos templários, que estão intactos e armazenados em arquivos locais, são impressionantes. Especialmente dada à falta de recursos oficiais e a completa frustração de lidar com arquivos apáticos.
Um destes grupos de pesquisas é o Abraxa, dirigido pelo britânico expatriado Nicole Daew e pelo texano Charles Bywaters, na estância hidromineral de Rennes-les-Bains, Aude. Suas pesquisas, em conjunto com as da rede de grupos semelhantes, realizaram descobertas sólidas e documentadas que, literalmente, reescrevem os estudos dedicados aos templários. Nadando contra a maré da apatia oficial, por um lado, e, pelo outro, tentando controlar o entusiasmo extremo dos caçadores de tesouro locais, que representam uma ameaça bastante real aos sítios arqueológicos de pesquisa, Nicole e Charles descobriram locais fundamentais relativos aos templários que, no entanto, nunca haviam sido tocados pelas pás dos arqueólogos. Grande parte de seus trabalhos ainda permanece inédita, embora eles planejem publicá-los em um futuro próximo.
Portanto, se quisermos saber mais sobre a vida dos templários, nesse berço da heresia que é o Languedoc-Roussillon, não devemos procurar os centros acadêmicos, mas sim Charles e Nicole. Feito isso, eles responderam que havia claras ligações entre os dois grupos e que estas foram bem alem de meros laços familiares os quais eram geralmente negligenciados pelos historiadores. Por exemplo, até mesmo no auge da cruzada dos Albigenses os templários abrigaram cátaros fugitivos, e existem exemplos documentados de que também prestaram socorro aos cavaleiros que abertamente lutaram ao lado dos cátaros contra os cruzados.
Como disse Nicole:
“Você só precisa cruzar os sobrenomes cátaros dos documentos da Santa Inquisição com os nomes dos templários do mesmo período para perceber que são os mesmos. No entanto, mais particularmente, é inegável que algumas edificações dos templários alojaram, deram abrigo, e até mesmo enterraram os cátaros em chão sagrado”.
Alguns têm sido cínicos a ponto de sugerir que isso ocorreu porque essas pessoas, a fim de se tornarem membros seculares to Templo, doaram-lhes todas as suas posses e bens. Na verdade, temos provas de cátaros que se socorreram junto aos templários depois de terem perdido completamente todo o que possuíam, e não só foram recolhidos em determinados abrigos, como lá foram enterrados ao morrerem. Mais tarde, os templários algumas vezes faziam o que estivesse ao seu alcance para assegurar as famílias cátaras, ou a seus descendentes, que tivessem suas terras de volta”.
Charles prosseguiu:
“Em uma área em particular, os templários, claramente permitiram que houvesse atividade hostil partindo de suas edificações. Os cavaleiros cátaros continuavam a lutar, e quando se retiravam, seguiam para uma propriedade dos templários. Esses fatos estão fartamente documentados”.
Isso representava algo bastante significativo para nos porque, dado que algumas das acusações levantadas contra os templários foram indubitavelmente forjadas, a única coisa não usada como evidencia contra eles foi a intima relação que mantinham com os cátaros desterrados. Que a Inquisição estava completamente ciente desse fato é revelado pelas escavações que fez nas propriedades templárias, desterrando os corpos dos cátaros a fim de queimá-los e dessa forma intimidar outros possíveis hereges, mesmo já tendo se passado mais de trinta anos desde o final da Cruzada. -E foi a inquisição que torturou os templários, portanto, se alguém sabia da conexão destes com os cátaros, esse alguém era a própria Santa Inquisição. Era obvio que havia mais coisas acontecendo, talvez até mesmo algo que fosse do conhecimento da Coroa Francesa, mas era algo considerado tão perigoso se fosse tornado publico que nenhuma palavra sobre o assunto veio a tona. Durante toda a nossa pesquisa sobre os templários, tivemos o desconfortável, e crescente, sentimento de que algum segredo monumental estava á espreita abaixo da superfície da historia oficial. Poderia ser que os templários e os cátaros compartilhassem algum conhecimento potencialmente explosivo? E esse segredo poderia ter sido o real motivo de Filipe o Belo ter arquitetado essa muito bem planejada campanha contra os templários?
Nem todos os templários pereceram naquela sexta feira fatídica do século XIII. Há muitos se permitiu que vivessem e recomeçassem usando um outro nome. Dois países, em particular, ofereceram moradias seguras para os cavaleiros fugitivos, a Escócia e Portugal e neste ultimo os templários tornaram-se conhecidos como os cavaleiros de Cristo.
A região ao redor de Languedoc - aprendemos com Charles e Nicole - foi testemunha de uma curiosa exceção no padrão geralmente empregado na perseguição. Roussillon - parte leste da região - na verdade vivia sob a proteção do reino espanhol de Aragon, enquanto que o norte, que incluía Carcassonne, fazia parte da França. Os templários de Roussillon foram presos, julgados e inocentados e quando o papa fechou oficialmente a Ordem, eles ou se juntaram a outras fraternidades semelhantes ou passaram o resto das vidas em suas terras vivendo de pensão.
Como sugeriram vários comentadores, os templários sobreviveram à tentativa de exterminá-los totalmente e continuaram existindo até hoje em dia, embora haja evidencias de que eles sofreram muitos cismas e operaram através de diferentes organizações, todas afirmando ser descendentes diretas da Ordem original.
Se os templários estivessem escondendo algo que fosse julgado extremamente perigoso pelo rei francês, a ponto de fazê-lo tomar uma ação drástica contra eles, o que poderia ser? Quem estava usando quem entre o papa e Filipe? De qualquer ângulo que vejamos esta historia, parece que um elo crucial está faltando.
Suponhamos que esse componente evasivo fosse do interesse do Monastério de Sion. Como já vimos, existem indicações de uma presencia sombria por trás do próprio surgimento dos templários, e esse mesmo grupo de manipuladores - quem quer que eles fossem - parecia dirigir a cena conforme sua vontade. Charles e Nicole não têm nenhuma duvida sobre a existência de um “circulo secreto” organizado dentro da própria liderança dos templários, o qual antedatou ao inicio oficial da Ordem. Eles assim prosseguem até o ponto de argumentar que o movimento templário fora criado para dar a esse circulo secreto uma face publica, na mesma época em que a Terra Santa fora aberta aos viajantes europeus.
Outros pesquisadores também chegaram à mesma conclusão. Como o escritor francês Jean Robin - utilizando-se das pesquisas de Geoges Cagger - afirma:
“A Ordem do templo constituía-se na verdade de sete círculos “externos” dedicados aos mistérios secundários, e de tres círculos “internos” correspondendo à iniciação nos grandes mistérios. E o “núcleo” era composto por aqueles setenta templários “interrogados” por Clemente V após terem sido presos”.
De modo semelhante, no seu “The Sign and the Seal”, o autor britânico Graham Hancock escreve:
“A pesquisa que eu havia conduzido sobre as crenças e comportamentos desse estranho grupo de monges-guerreiros convenceram-me de que eles haviam deparado com alguma tradição de sabedoria sumamente antiga”
Constituir um grupo interno secreto era algo bastante possível, pois os templários eram, essencialmente, uma escola de mistério, isso é; eles operavam como um sistema hierárquico que se baseava na iniciação e no segredo. É portanto bastante provável que não só os templários de patente rasa soubessem consideravelmente menos do que seus superiores, como as crenças desses últimos fossem bastante diferentes. É provável que a maioria dos cavaleiros templários não fosse mais do que os simples soldados cristãos que aparentavam ser. O circulo secreto, porem, era algo muito diferente.
A razão da existência do circulo secreto dos templários parece ter sido a de acelerar o avanço das pesquisas sobre questões esotéricas e religiosas. Talvez uma das razões para que se mantivessem em segredo fosse o fato de lidarem com aspectos enigmáticos relacionados aos mundos judeus e islâmicos. Eles buscavam, literalmente, os segredos do universo onde quer que suspeitassem que poderiam ser encontrados, e em sua rota geográfica e intelectual de incessantes questionamentos talvez viessem a tolerar, e até mesmo abraçar, algumas crenças não muito ortodoxas.
Naqueles dias a busca incessante de conhecimento deve ter sido uma força motriz particularmente forte e irresistível. Os templários, porem, não se interessariam de vontade própria por essas complexas pesquisas, afinal eles eram pessoas intrinsecamente praticas. Quando seguiam uma linha de pesquisa em particular era por uma razão muito boa e, por causa disso, deixaram certas pistas sobre o que realmente importava para eles.
Uma dessas pistas encontra-se nas obsessões de Bernard de Clairvaux, “eminence grise” dos templários. Esse ferino monge intelectual, aparentemente, devotava-se totalmente à Virgem Maria como bem o demonstram muitos de seus sermões. No entanto, parece-nos que a Virgem não era objeto do verdadeiro amor espiritual de Bernard. Era uma Maria completamente diferente cuja identidade é sugerida pelo fato dele ter sido particularmente apaixonado pelas Madonas Negras. Também chegou a escrever quase noventa sermões sobre o Cântico dos Cânticos e pregou de modo muito mais explicito ligando a “Noiva” a Maria de Betânea que naquela época era inquestionavelmente a própria Maria Madalena.
“Sou negra mas graciosa” diz a amante - uma frase que também une o Cântico dos Cânticos ao culto das Madonas Negras - a quem Bernard - que nasceu em Fontaines perto de Gijon, lugar central do culto das Madonas Negras - era excepcionalmente dedicado. Ele afirmou ter recebido sua inspiração como uma criança que recebe tres gotas do leite milagroso do peito da Madona Negra de Chãntillon. Especulou-se que isso era uma referencia codificada à iniciação dele, Bernard, ao culto das Madonas. E quando Bernard rezou pela segunda Cruzada, escolheu fazê-lo em Vézalay, centro fundamental ao culto de Maria Madalena.
Então é provável que a aparente devoção de Bernard para com a Virgem fosse simplesmente uma cortina de fumaça para a sua verdadeira paixão por Madalena, embora, é claro, as duas não sejam mutuamente exclusivas. Contudo, ao criar a Regra dos Templários, Bernard recomendou que os cavaleiros prestassem “obediência a Betânia e ao castelo de Maria e de Marta”. E ele é bem conhecido por ter repassado tal devoção particular á Ordem. Até mesmo em face da total extinção os cavaleiros aprisionados com o Grão-Mestre Jaques de Molay, nas masmorras da fortaleza de Chinon, compuseram uma oração dedicada a “Notre Dame” – “Nossa Dama”, “Nossa Senhora” - na qual mencionam São Bernardo como fundador da religião da Santificada Virgem Maria. Em face, porem, de todas as outras evidências, esse também pode ter sido uma outra referencia codificada ao culto de Madalena.
É bastante significativo que o juramento dos templários fosse a “Deus e a Nossa Senhora”, ou com freqüência a “Deus e a Santa Maria”. Alguns insinuam que a “Nossa Senhora” do juramento não é a Virgem, o que é reforçado pelas palavras da absolvição dos templários; “eu peço a Deus que me perdoe os meus pecados, como perdoou os de Santa Maria Madalena e os do ladrão que foi pregado na cruz”. Isso pelo menos demonstra a importância de Madalena para os templários. É notável que no caso dos templários de Roussillon, durante seu cativeiro, as condições em que se encontravam fossem deliberada e especificadamente pioradas – por ordem do próprio papa – no exato dia em que se comemorava Santa Maria Madalena. Lembremos que o massacre de Béziers também aconteceu no dia das festividades a Madalena para deixar bem clara a natureza da “heresia”.
Na realidade, os templários estavam preocupados com a idéia do Feminino como um todo, um conceito que pode parecer estar seriamente em conflito com sua imagem de guerreiros. Contudo, como Charles e Nicole descobriram, a Ordem do Templo incluía mulheres. Durante os primeiros anos de sua existência muitas mulheres fizeram o juramento da Ordem, embora tenham permanecido como membros seculares do Templo. Mesmo se não há nenhuma indicação de que havia um enclave de rainhas guerreiras dentro da Ordem dos templários, como afirmaram Michael Baigent e Richard Leigh em “The Temple and the Lodge” -1989:
“um antigo relato do século XII, na Inglaterra, fala de uma mulher que é recebida no Templo como uma irmã e insinua de modo bastante claro haver algum tipo de ala ou anexo feminino na Ordem. Contudo, nenhuma elaboração ou esclarecimento foi encontrado sobre esse assunto. Mesmo tal informação, que poderia estar contida nos registros oficiais da Inquisição, já há muito tempo desapareceu ou foi suprimida....”
Nicole e Charles, partindo de estudo profundo dos documentos dos templários, são bem mais enfáticos:
“Se você voltar aos documentos do século XII, verá que há inúmeros exemplos de mulheres que haviam se juntado a Ordem, com certeza em seu primeiro século de existência. Qualquer pessoa que ingressasse na ordem deveria em juramente “dar minha casa, minhas terras e meu corpo e alma à Ordem do Templo”. Você tem os nomes de mulheres no termino desse documento, assim como de homens também, e você tem com freqüência casais que ingressavam em conjunto e, portanto, as mulheres também deveriam fazer o juramento. Esses documentos são principalmente dessa região - o Languedoc - e existem muitos exemplos que demonstram que deve ter havido um numero bastante grande de mulheres envolvidas em determinada época”.
Os documentos também indicam que ouve uma mudança nas regras, porque passaram a proibir que os templários fossem mulheres, ficando subentendido que até aquele momento isso era possível. Quando expressamos nossa surpresa quanto a esse fato não ser amplamente conhecido, Charles explicou:
“Às vezes parece que muitas dessas informações foram intencionalmente negligenciadas. O que você obtém nos livros é um punhado de informações redundantes, a mesma coisa repetida inúmeras vezes. Isso faz com que tenhamos apenas duas opções possíveis: ou essas pessoas são cegas, ou por alguma razão muito especifica elas não estão interessadas naquelas informações. Se você é um pesquisador, o que supostamente essas pessoas são, essas informações deveriam fazê-los saltar. Porem, elas nem sequer levam isso em consideração”.
É notável que o arrastão geral de 13 de outubro de 1307 ocorresse sem derramamento de sangue. Por toda a França os senescais do rei receberam ordens lacradas que lhes comandavam que organizassem tropas suficientes para prender os mais bem treinados guerreiros da cristandade, algo como uma delegacia de policia receber ordem para prender tropas da Policia do exercito estacionadas na região. A maioria dos templários na França parece ter sido levada como cordeiros para o matadouro. É estranho que os cavaleiros não tenham pedido reforço de fora da França.
De modo significativo alguns dos cavaleiros - inclusive o tesoureiro da Ordem - conseguiram escapulir de um modo que indica que eles teriam sido avisados com antecedência. Alem disso, a famosa frota dos templários, fundeada na França, simplesmente desaparecera naquele momento. Em todos os registros das pilhagens dos templários feitas pelo rei francês, não há um único navio listado. Onde a frota foi parar? Dificilmente teria desaparecido no ar.
O circulo secreto dos templários, porem, perece ter caminhado grandes distancias a fim de preservar seu conhecimento secreto. Como o respeitado estudioso no Novo Testamento, Hugh Schonfield, demonstrou, os templários utilizaram um código conhecido como a “Cifra de Atbash”. Isso é algo verdadeiramente notável pois esse mesmo código havia sido usado pelos autores de alguns dos Manuscritos do Mar Morto mil anos antes da fundação da Ordem dos Templários. O que quer que isso signifique, por si só, já revela que os templários eram peritos em manter seus segredos através dos mais engenhosos meios, alem de mostrar que seus conhecimentos vinham de fontes longínquas e esotéricas. Schonfield revela que, quando o código é aplicado ao nome do misterioso ídolo decapitado venerado pelos templários, Baphomet, esse então se transforma na palavra grega “Sophia”. Graham Hancock escreve em “The Sign and the Seal” que “Sophia” significa nada mais nada menos que “sabedoria”. Na realidade, porem, significa muito mais do que isso, e seu significado total acrescenta uma luz diferente a toda “raison d´ètrte” dos templários.
Significando simplesmente “sabedoria” - em hebreu “Chokmah” - uma figura feminina que aparece no Antigo Testamento - especificadamente no livro dos Provérbios - Sophia, tem causado muito embaraço entre os estudiosos judeus e cristãos porque é apresentada como sendo a parceira de Deus, a que exerce influencia sobre ele e de fato o aconselha.
Sophia também era fundamental para a cosmologia gnóstica; na verdade, nos textos “Pistis” Sophia do Nag Hammadi está intimamente associada à Maria Madalena. E, assim como Chokmah, ela é a chave para se compreender o gnosticismo da Cabala - o importante e muito influente sistema esotérico que deu base para a magia do período medieval e do Renascimento. Para os gnósticos ela era a deusa grega Atenas e a deusa egípcia Ísis, que ás vezes também era chamada Sophia.
Tomado de forma isolada, é claro que o uso da palavra Sophia pelos templários, como a decodificação da palavra Baphomet, não revela qualquer reverencia especial em relação ao mundo feminino. Eles podiam muito bem estar apenas reverenciando a busca da sabedoria. Entretanto, existem muitas outras indicações de que isso fazia parte de uma profunda obsessão em relação ao principio feminino, que vai muito além de uma mera questão de semântica, a ponto dos templários, e na verdade de vários outros grupos esotéricos, estarem bastante interessados nesta questão.
Como nos diz o pesquisador escocês Niven Sinclair, cujos conhecimentos sobre os templários é particularmente extenso: “Os Templários decididamente acreditavam no poder feminino”. Niven não tem qualquer duvida a esse respeito e não há nada de estranho nisso.
Os Templários habitualmente davam um formato circular a suas igrejas, pois acreditavam que essa era a forma do Templo de Salomão. Por outro lado, isso pode ter simbolizado a idéia de um universo redondo, mas é mais provável que representasse o feminino. Círculos e ciclos, sempre estiveram associados à deusa e a tudo o que é feminino, seja esotérico ou biológico. É um símbolo arquetípico recorrente na historia da civilização: as sepulturas da era pré-histórica eram montículos arredondados porque representavam o útero da mãe terra que tomaria de volta o defunto para que então renascesse entre os espíritos. E todos nos estamos familiarizados com o arredondamento de uma barriga grávida e com o símbolo da frase “Mãe” das deusas à lua cheia. Qualquer que seja o significado preciso do formato circular para os Templários, não há nenhuma duvida de que esses sempre foram eminentemente ‘masculinos’. E após a época dos Templários a construção de igrejas em formato circular foi oficialmente considerada herética pela igreja. Porem, como já notamos, a igreja francesa de Londres é redonda, uma característica que se repete e é reforçada por outros motivos decorativos, tanto internos quanto externos.
Os Templários, parece, haviam acumulado conhecimentos exóticos e heréticos, mas isso foi acidental ou proposital? As evidencias apontam para esta ultima hipótese: eles estavam em busca de certos segredos que, uma vez sob seu poder, lhes permitiriam optar entre aplicá-los ou retê-los. Uma vez que muitos de seus segredos ainda permaneciam sob sua guarda, os Templários deixaram algumas pistas de alguns deles em forma de códigos, algumas até mesmo esculpidas em pedra.
Os cavaleiros Templários eram a força motriz por traz da construção das grandes catedrais góticas - especialmente a de Chartres. Sendo os principais, e com freqüência os únicos “desenvolvimentistas” nos grandes centros culturais europeus, também estavam por traz da formação das guildas de construtores, incluindo a de pedreiros, que se tornaram membros seculares da Ordem dos Templários com vantagens que incluíam a isenção de pagamento de taxas.
Por toda a longa historia das grandes catedrais o estranho simbolismo dos motivos de decoração e do projeto confundiu peritos das mais diversas disciplinas. Foi apenas recentemente que tal simbolismo passou a ser visto como o que realmente era: a codificação do conhecimento esotérico dos Templários. Graham Hancock, ao discutir a arquitetura sagrada dos antigos egípcios, nota que ela só foi igualada na Europa pelas grandes catedrais góticas da idade media, como a de Chartres, e coloca a seguinte questão: ‘Terá sido mero acidente?’ Hancock continua:
Já suspeitara há muito tempo que realmente tinha havido uma conexão e que os cavaleiros Templários, através de suas descobertas durante as Cruzadas, poderiam ter formado o elo perdido na cadeia de transmissão dos conhecimentos arquitetônicos secretos. São Bernardo, o protetor dos Templários, havia definido Deus, o que é inacreditável tratando-se de um cristão, com “comprimento, altura, largura e profundidade”. Também não poderia deixar de lembrar que os próprios Templários haviam sido grandes construtores e grandes arquitetos, ou que a ordem monástica dos cistercienses, a qual São Bernardo pertencera, também se superara nesse campo particular da atividade humana.

O projeto das catedrais foi especificadamente elaborado para levar em conta, para exemplificar, os princípios da geometria sagrada. É a idéia de que a proporção geométrica traz dentro de si uma ressonância da harmonia divina, e a de que algumas proporções em particular são mais divinas do que outras. É isso que está por traz da rude declaração de Pitágoras de que “o numero é tudo” e reforça o conceito hermético de que as matemáticas são o código através do qual os deuses falam com a humanidade. Os artistas e projetistas do Renascimento eram grandes adeptos dessa arquitetura esotérica em particular, para quem a “relação aura” – para eles a proporção perfeita – era quase que uma panacéia universal. Porem, de modo algum se limitaram a essa explicação, e o conceito da geometria sagrada permeou todos os aspectos de suas vidas intelectuais. Os desenhos de Leonardo, sejam de homens ou de máquinas, o interior das flores ou o formato de uma onda, comunicava a convicção do artista de que havia significados nos padrões e harmonia nas proporções, e um de seus desenhos mais famosos, O Homem Vitruviano, literalmente incorpora a relação áurea.


Este é o homem vitruviano de Leonardo da Vinci que é conservado nas Galerias da Academia de Veneza. O desenho remonta ao ano 1490, é uma das obras mais famosas do artista e ilustra o cânone das proporções humanas que Vitruvio, arquiteto romano do I século a.C., havia colocado no centro da sua teoria arquitetônica.
É evidente que esse é o motivo da redescoberta do homem vitruviano na idade do renascimento, porque ao homem, naquele momento, continuava sendo atribuída a dimensão ideal – a proporção divina - para o dimensionamento de todas as coisas.
Ho homem, por exemplo – a exceção dos que nasceram imperfeitos devido a causas varias a nível pré-natal – independente da sua altura, terá sempre seus contornos físicos obedecendo a idênticas dimensões, ou seja, o mesmo padrão.

O legendário Templo de Salomão era, para os Templários e para os Maçons que vieram depois, a jóia da coroa e o melhor exemplar da geometria sagrada. Não apenas era uma suprema delicia para os olhos de qualquer um que o observasse ou rezasse dentro dele, como seu alcance ia muito além dos cinco sentidos. Foi pensado para ressonar - de um modo transcendental e sem igual - com a própria harmonia celestial; seu cumprimento e largura, altura e profundidade estavam completamente de acordo com as proporções mais adoradas pelo universo. O Templo de Salomão era tido como sendo a própria alma de Deus escrita na rocha.
Muitos dos atuais visitantes ficam perplexos com os motivos, de clara natureza astrológicas, gravados nas pedras das antigas catedrais. Com certeza, alguém hoje poderia chegar a pensar que o inconfundível símbolo de Áries esculpido na entrada principal de tão veneráveis edificações deve ser uma aberração, uma excentricidade pessoal de algum dos pedreiros. No entanto, em muitas catedrais diferentes esses sinais se repetem e nunca de forma fortuita.
Todo o grandioso simbolismo encontrado nas catedrais era entendido pelos iniciados da época como um reflexo do antigo provérbio hermético: “Assim em cima, assim embaixo”. Acreditava-se que a frase tivesse vindo da Tabua das esmeraldas, de Hermete Trimegisto, o lendário mágico ou mago egípcio, embora as palavras que a compõe possam ser muito mais antigas. Elas querem dizer que tudo o que há na terra tem numa contra partida no céu e vice-versa, conceito que Platão tornou popular com sua noção do “Mundo das idéias”. De acordo com isso, tudo o que existe, de uma colher até um homem, é somente uma versão de um modelo ideal que existe em algum tipo de dimensão alternativa plena de modelos perfeitos. Os magos ou magi foram mais adiante.
Acreditavam que todo pensamento ou ato refletia-se em outro plano e que ambas as dimensões afetavam uma a outra de um modo irresistível. Existem ressonâncias desse conceito na moderna idéia cientifica de universos paralelos, assim como nas historias dos deuses antigos, com os seus ciúmes insignificantes e, com freqüência, sórdidas obsessões, que eram vistos como sendo os representantes arquetípicos da raça humana. Para nossos ancestrais não havia nenhuma discrepância em prostrar-se humildemente perante o grande deus do Olímpo, Zeus, e ao mesmo tempo acreditar que ele, ocasionalmente, tomava a forma de um animal para seduzir as moças da Terra. Era esperado de um deus que se comportasse como um homem, porém - o inverso desse conceito é a idéia “herética” para os judeus e cristãos - de que um homem pudesse se tornar um deus.
Nada disso era novidade para os Templários. O projeto das catedrais revela uma compreensão dos princípios herméticos por parte dos pedreiros, assim como dos cavaleiros que patrocinavam a construção. Eles, de todos os povos medievais, apreciavam especialmente a aplicação pratica , onde quer que fosse possível, de todo e qualquer conhecimento esotérico. Para eles a codificação das mensagens secretas nas próprias pedras das catedrais ia muito além de mera fantasia. Como Baigent e Leigh dizem no seu livro “The Temple and the Lodge”: Deus havia ensinado a aplicação pratica da geometria sagrada através da arquitetura. E novamente nos vimos caminhando em direção ao Templo de Salomão.
Filho do legendário herói judeu, o rei Davi, Salomão construiu um templo de profunda beleza utilizando os melhores e mais caros materiais. Foram usados mármores e pedras preciosas, madeiras aromáticas e os tecidos mais raros para criar um lugar que faria os sentidos dos veneradores flutuar em delicia, onde o próprio Deus se sentiria em casa. No centro de tudo ficava o mais sagrado dentre o sagrado, e ai o sacerdote poderia receber o Todo Poderoso por meio do mais misterioso dos instrumentos, a Arca da Aliança. Este dispositivo notoriamente temperamental era, por um lado, conhecido por conceder grandes benções àqueles que eram virtuosos, mas, por outro lado, destruiria os malfeitores ou aqueles aquém não houvesse sido dito como combater os efeitos de sua presença maligna. Para os Templários isso talvez se parecesse como a arma suprema, e, portanto, saíram em sua busca conforme alguns tem sugerido.
Talvez existam pistas daquilo que os Templários realmente acreditavam ser o significado da “Arca”, presente nos motivos decorativos das catedrais. Por exemplo, a Catedral de Chartres, fruto da imaginação de sua “éminence grise” Bernard de Clairvaux, contem uma escultura de pedra que parece ser a Virgem Maria na qual está gravada a marca “arcis foederis”: Arca da Aliança. Isso por si só não é muito significativo, pois esse era um símbolo cristão comum no período medieval. Mas como Chartres era um ponto central para o culto da Madona Negra, estaria a Arca sendo comparada com aquela outra Maria, a Madalena, ou até mesmo com uma deusa pagã muito mais antiga? Talvez seja o próprio principio feminino que esteja sendo evocado, utilizando-se, para despistar, o símbolo de Maria. Isso não pode ser uma referencia à própria Virgem, pois os arquitetos da catedral gótica tinham uma razão especial para evocar o Arquétipo de “uma mulher sexualmente ativa”. É também significativo que as primeiras representações da lenda da vida de Maria Madalena, na França, estivessem nos vitrais da Catedral de Chartres.
Na verdade é a difamada e bem pouco compreendida alquimia que, com freqüência, está por traz dos motivos aparentemente bizarros das construções góticas - e era realmente a alquimia que aparentava ser o dado em comum entre a maioria dos Grão-Mestres do Monastério de Sion. Acredita-se que a alquimia tenha sido transmitida pelo Egito antigo através dos árabes - a própria palavra, alias, deriva do árabe. A alquimia significava mais do que ciência: a pratica compreendia uma bem concatenada teia de atividades encadeadas e modo de pensar, da magia à química, da filosofia e hermetismo à geometria sagrada e a cosmologia. Também pesquisava o que hoje chamaríamos de engenharia genética - método para retardar o processo de envelhecimento - e a tentativa de conquistar a imortalidade física. Os alquimistas ansiavam por conhecimentos e não tinham tempo a perder com antagonismos da igreja contra as experimentações. Eles, então, se ocultaram e continuaram suas pesquisas secretamente. Para os alquimistas não existia tal coisa chamada heresia, enquanto que para a igreja não existia um alquimista que não fosse herético; conseqüentemente, a pratica da alquimia tornou-se conhecida como ‘Magia Negra’.
A alquimia compreendia diversos níveis: o externo, ou esotérico, que se dirigia à manipulação e experimentações dos metais, mas havia outros níveis, muito mais secretos e que incluíam a realização misteriosa da “Grande Obra”. Tal coisa era vista como o momento supremo da vida de um alquimista, quando então, finalmente, transforma-se metal comum em ouro. Nos círculos esotéricos, porem, isso também é visto como o ponto em que a pessoa se torna espiritualmente iluminada e fisicamente revitalizada, através de um “trabalho” de magia que gira em torna da sexualidade. Parece que a Grande Obra representava um ato de iniciação suprema.
Talvez se acreditasse que esse ritual fosse capaz de proporcionar a longevidade: existem rumores que afirmam que Nicolas Flamel, supostamente Grão-Mestre do Monastério de Sion, realizou a Grande Obra em companhia de sua mulher Perenelle no dia 17 de janeiro de 1382 e que teria, após tal realização, vivido durante um tempo excepcionalmente longo.
Em alquimia o símbolo para designar a consecução da Grande Obra é o hermafrodita: literalmente a junção do deus Hermes com a deusa Afrodite. Leonardo era fascinado pelos hermafroditas, chegando a ponto de preencher paginas e mais paginas com esboços destes de um modo um tanto pornográfico. Um estudo recente sobre o retrato mais famoso do mundo - o maliciosamente enigmático sorriso de Mona Lisa - mostrou de forma persuasiva que “ela” era ninguém mais ninguém menos que o próprio Leonardo. Os pesquisadores, Doutores Digby Quested - do Hospital de Maudsley em Londres, e Lílian Schwartz - dos Laboratórios Bell nos E.U.A., utilizaram as mais sofisticadas técnicas de computação, independentemente um do outro, para sobrepor a face do retrato com a face do artista: o resultado foi uma justaposição perfeita. Talvez essa fosse mais uma das inacreditáveis e inteligentes piadas que ele legou para a posteridade, mas há também a possibilidade de que Leonardo, sendo um alquimista, estivesse sumariando o fato de ter realizado a Grande Obra.
Alguns acreditam que tal feito poderia ocasionar uma transformação física tão profunda que o bem-sucedido alquimista poderia até mesmo mudar de sexo. Talvez fosse este o conceito por traz da Mona Lisa. Mas o símbolo do hermafrodita também representa o momento do orgasmo, quando tanto o macho como a fêmea que participam do ritual são envolvidos pela sensação de plena união um com o outro, incluindo a expansão dos próprios limites em direção a uma consciência mística de si mesmos e do universo.
As catedrais góticas ostentam muitas figuras curiosas, de demônios a homens verdes. Alguns, porem, ultrapassam o estranhamento: uma escultura na Catedral de Nantes mostra uma mulher olhando para um espelho, embora o reflexo seja, na verdade, o de um homem velho. E em Chartres a escultura da “Rainha de Saba”, de fato, porta uma barba! Os símbolos alquímicos podem ser encontrados em muitas das catedrais associadas aos cavaleiros Templários.
Essas correlações são implícitas, mas Charles Bywaters e Nicole Dawe descobriram locais relacionados com os Templários no Languedoc-Roussillon que continham um simbolismo alquímico explicito:
“Nossa pesquisa mostrou, entre outras coisas, que eles estavam de alguma forma bastante familiarizados com as propriedades do solo. Em uma área, em particular, eles construíram um Hospital para os Templários que voltavam da Terra Santa, pois ali a terra tinha propriedades curativas. Existem símbolos alquímicos neste local....
Fica bastante claro que estavam familiarizados com a alquimia. É significativo encontrar-se um local que fora especificadamente escolhido em virtude da natureza da terra, onde existem evidentes símbolos alquímicos em sua estrutura e alem de muitos elementos vinculados aos cátaros e aos muçulmanos. E esta evidencia é consistente, documentada, e bastante fácil de ser provada”.
Durante nossas viagens à França, repetidamente, vimos que as cidades que haviam sido propriedades dos Templários, como Utelle - na Provença e Alet-les-Bains - no Languedoc, subseqüentemente haviam se tornados centros de alquimia. Também é significativo que os alquimistas, assim como os Templários, reverenciassem a figura de João Batista de um modo especial.
Como já vimos, as grandes catedrais e muitas das igrejas mais famosas foram construídas em locais conhecidos por terem sido consagrados a deusas antigas. Por exemplo, Notre-Dame, em Paris, erigiu-se sobre as fundações de um templo dedicado a Diana, e St Sulpice, em Paris, foi construída sobre as ruínas de um templo dedicado a Ísis. Tomado isoladamente este ponto nada tem de incomum, pois por toda parte, na Europa, foram construídas igrejas cristãs sobre antigos locais pagãos como um movimento deliberado por parte da igreja a fim de demonstrar que essa havia triunfado sobre eles. Mas, com freqüência, o que na verdade acontecia era que os habitantes locais simplesmente adaptavam seus costumes pagãos ao cristianismo, e, então, viam o local da nova igreja como sendo complementar e não oposto à antiga Religião. No entanto, em face dos evidentes interesses mais profundos dos Templários, não poderia ser que no caso das catedrais eles pretendessem dar continuidade à veneração do principio feminino ao invés de suprimi-lo? Talvez as catedrais fossem hinos às deusas esculpidas na rocha. E Notre-Dame, a quem tantos deles eram dedicados, era na verdade o próprio princípio feminino ou, Sophia...
A maioria das pessoas hoje pensa na arquitetura gótica como algo essencialmente “masculino”, com seus pináculos desafiando as alturas e naves em forma de cruz, mas a maior parte da decoração interna é intensamente feminina, especialmente as esplendidas janelas em forma de rosa. Bárbara G. Walker indica outros significados:
“A rosa, que os antigos romanos conheciam como Flor de Vênus, era o distintivo das prostitutas sagradas. As coisas ditas “debaixo da rosa” - sub rosa - eram parte dos mistérios sexuais de Vênus que não seriam revelados aos não iniciados.
Na época áurea da construção das catedrais, quando Maria era venerada como uma Deusa em seu “Palácio da Rainha Celestial”, ou Notre-Dame, ela foi com freqüência chamada de Rosa: Rosa-arbusto, Rosa-guirlanda, Rosa mística. Assim como um templo pagão, a catedral gótica representava o corpo da Deusa que também era o universo, enquanto continha a essência de divindade masculina dentro de si mesma...
A Rosa, como veremos, também era um símbolo adotado pelos trovadores, esses cantores de canções de amor do sul da França que estão intimamente ligados com os mistérios eróticos”.
Outros símbolos encontrados nas catedrais góticas trazem potentes mensagens subliminares sobre o poder feminino. As teias de aranha esculpidas - uma imagem que se repete na cúpula em forma de clarabóia da igreja de Notre-Dame, em Londres - representa Aracne, a deus-aranha que rege o destino dos homens, ou Ísis no papel da tecelã do destino. Da mesma forma, o grande labirinto pintado no chão da Catedral de Chartres refere-se aos mistérios femininos e através dele o iniciado só consegue encontrar o caminho se seguir o fio de linha fornecido pela Deusa. Esse lugar, portanto, não foi planejado para ser palco de veneração da Virgem Maria, em particular porque também abriga uma Madona Negra, Notre Dame de Souterrain - Nossa Senhora do Subterrâneo. Em Chartres também há um vitral que descreve a chegada do barco de Madalena à França, combinando assim uma referencia à lenda desta com a de Ísis, para quem os barcos também eram um meio de transporte predileto. - Talvez o Nautonnier, o timoneiro, titulo do Grão-Mestre do Monastério, decorra de seu papel assumido no Navio de Ísis. Esse vitral é a mais antiga representação da lenda de Madalena na França e, uma catedral há muitos quilômetros de Proença foi considerada pelos arquitetos algo de grande significado.
Ao mesmo tempo em que as catedrais estavam sendo construídas, a heresia encontrava outra porta, desta feita assegurando-se de que sua mensagem seria lembrada pela historia, embora, como na Ultima Ceia de Leonardo, as decodificações através das quais essas mensagens encontram expressão sejam, com freqüência, marcadas pela pouca compreensão em relação ao que está realmente sendo dito. Essa outra tradição herética era a das lendas do Graal.
Hoje o termo “Santo Graal“ é freqüentemente utilizado com o significado de uma meta fugidia, o premio resplandecente que ira coroar o trabalho de toda uma vida. A maioria das pessoas, no entanto, percebe que isso está relacionado com algo mais antigo e religioso em sua natureza, e no geral com a taça em que Jesus bebeu na Ultima Ceia.
Uma lenda conta que José de Arimatéia, o rico amigo de Jesus, nela coletou o sangue derramado na Crucificação, sangue em que foram encontradas propriedades curativas. A procura do Santo Graal é vista como uma busca repleta de perigos físicos e espirituais, em que aquele que procura tem que se bater com as mais diversas espécies de inimigo, incluindo os do reino sobrenatural. Em todas as versões da historia a taça é um objeto, literal e simbolicamente, da perfeição. Ela representa algo que pertence a duas dimensões, a real e a mítica, e é capaz de cativar a imaginação como nenhuma outra coisa.
O Graal pode ser visto como um objeto misterioso, um tesouro verdadeiro que está em algum lugar de alguma caverna, mas que, entretanto, sempre carrega a idéia implícita de que simboliza algo inefável, muito alem do mundo cotidiano. Essa áurea de busca espiritual surgiu não só das lendas originais do Graal, como também da cultura onde ela pela primeira vez apareceu.
Em nossa opinião, dentre os milhões de palavras que foram dedicadas a esse assunto no decorrer dos séculos, algumas das mais sabias podem ser encontradas no livro “The Holy Grail” de Malcolm Godwin, publicado em 1994. Esse livro é um sumario notável de todas as lendas e interpretações disparatadas, com a percepção de chegar diretamente ao cerne da matéria através da verbosidade dos estilos. Colocando de lado as habituais visões cristãs e celtas dos romances sobre o Graal dos séculos XII e XIII, Godwin também identifica uma outra visão igualmente importante, a alquímica. Ele revela que as versões mais antigas da historia do Graal sem duvida beberam nas fontes dos mitos celtas que permeiam os contos do grande herói Rei Artur e sua corte, e muitos dos elementos desses contos focalizavam os aspectos da veneração das divindades pelos celtas. As historias do Graal redefinem as antigas lendas celtas e as estendem a fim de abarcar as idéias heréticas que estavam em voga no século XIII.
O primeiro romance sobre o Graal foi o inacabado Le Conte Del Graal (c.1190), de Chréien de Troyes. A cidade de Troyes, de onde Chrétien tirou seu sobrenome, era um centro cabalístico e o local da preceptoria original dos Templários, alem de ser a cidade onde o Conde de Champanhe estabeleceu sua corte. Na verdade a maioria dos nove primeiros cavaleiros templários era vassala deste. A igreja mais famosa de Troyes é dedicada a Maria Madalena.
Na versão de Chrétien não há nenhuma menção de o Graal ser uma taça, nem há qualquer conexão explicita com a Ultima Ceia ou com Jesus Cristo. Na realidade não há qualquer conotação religiosa e já foi dito que sua ambientação original é claramente pagã. Aqui, no entanto, o Graal era uma bandeja ou prato, o que, como veremos, é algo bastante significativo. Na verdade, Chrétien se inspirou em um antigo conto celta no qual o herói, Peredur, deveria, em sua busca, se deparar com uma procissão horripilante e aparentemente extremamente ritualística em um certo castelo remoto. Sendo levada nessa procissão havia, entre outras coisas, uma lança que gotejava sangue e uma cabeça decapitada em uma bandeja. Uma característica comum nas historias do Graal é aquele momento critico em que o herói falha ao tentar formular uma pergunta importante, e é esse pecado de omissão que o coloca em grande perigo.
Como diz Malcolm Godwin: Aqui, a pergunta que não é feita está relacionada com a natureza da cabeça. Se Peredur tivesse perguntado de quem era a cabeça, e que relação tinha com ele, ficaria sabendo como quebrar os encantamentos da Terra Devastada. - A terra havia sido amaldiçoada e tornara-se infértil.
Mesmo não tendo um fim a historia de Chrétien era de uma fuga bem sucedida que deu origem a uma serie enorme de imitações, a maioria de caráter explicitamente cristão. Mas, como diz Malcolm, falando dos monges que lhe escreveram:
“Eles manobraram a fim de esconder uma obra de profunda heresia dentro desse mistério piedoso, de modo que tanto a lenda quanto o autor sobreviveram ao zelo ígneo dos padres da igreja. As mentes ortodoxas de Roma papal, embora nunca tivessem reconhecido, de fato, a existência do Graal, surpreendentemente se acovardaram em denunciar tal heresia... E é mais curioso ainda que a lenda sobrevivesse intacta ante a queda dos cátaros heréticos...e até mesmo dos Cavaleiros Templários que estavam claramente caracterizados em vários textos”.
Uma dessas versões cristianizadas era “Perlesvaus”, que foi, segundo alguns, escrito por um monge na Abadia de Glastonbury em 1205, enquanto que para outros esta obra é de um templário anônimo. Esse conto, na verdade, fala sobre duas buscas que estão entrelaçadas. O Cavaleiro Gawain procura a espada que decapitou João Batista a qual magicamente sangra diariamente ao meio dia. Em um episodio o herói encontra uma carroça que continha 150 cabeças decapitadas de cavaleiros: algumas estavam marcadas com ouro, algumas com prata e outras com chumbo. E há também uma estranha donzela que carrega em uma das mãos a cabeça de um rei, marcada com prata, e na outra a de uma rainha, selada com chumbo.
Em Perlesvaus os servos da elite do Graal usavam artigos de vestuário branco com seu brasão gravado - uma cruz vermelha - exatamente como os templários. Também há uma cruz vermelha que estava fincada em uma floresta e que se tornou um grande tormento para um dos padres, pois este bateu nela “em todas as partes” com uma vara, um episodio que tem uma clara conexão com a acusação de que os templários haviam batido e pisoteado na cruz. E, mais uma vez, há uma cena curiosa que envolve cabeças decapitadas. Um dos guardiões do Graal diz ao herói Percival: “Existem as cabeças marcadas em prata, cabeças marcadas em chumbo e os corpos a quem estas cabeças pertencem: eu digo o que você tem que fazer: vá la e pegue as cabeças do Rei e da Rainha”.
O simbolismo alquímico é pródigo: metais preciosos e comuns, reis e rainhas. Tal imaginário também é encontrado em abundancia em outra grande obra reescrita sobre a lenda do Graal. Apesar da tácita aversão da igreja para com o Graal, a versão mais cristianizada foi escrita por uma equipe de monges cistercienses denominada “Queste Del San Graal”, é notável pelo fato de utilizar-se do Cântico dos Cânticos para compor seu poderoso simbolismo místico.
De todas as estranhas historias do Graal a mais estranha e provocante de todas foi Parzival, do poeta bávaro Wolfranm van Eschenbach -1220. Nela o autor declara estar deliberadamente corrigindo a versão de Chrétiens de Troyes, que não contem toda a informação disponível. Ele afirma que sua historia é a mais precisa porque ele conseguiu a verdadeira historia com um Kyot, da Provença, que foi identificado como Guiot de Provins, um monge que tanto falava pelos Templários como cantava como um trovador. Como Wolfram escreve em Parzival: O conto autentico com a conclusão para o romance foi enviado da Provença para as terras alemãs. Mas qual era esta conclusão? Em Parzival o Castelo do Graal é um lugar secreto, vigiado pelos templários – que Wolfram chama de os “homens batizados” - o que é bastante significativo porque são enviados para espalhar sua fé em segredo.
No final da historia a portadora do Graal é o meio-irmão de Parzival – Fierefiz - partem para a índia e tem um filho chamado João - o famoso Prestes João - que é o primeiro de uma linhagem que sempre recebe o nome de João...Seria essa uma referencia codificada ao Monastério de Sion, cujos Grão-Mestres, supostamente, recebem esse mesmo nome?
O conceito de linhagem é fundamental para as teorias relativas ao Graal de Baigent, Leigh e Lincoln. Como o titulo do primeiro livro deixa claro, para eles o “Santo Graal” era de fato o “Santo Sangue”. Isto se baseia na idéia de que o original francês “Sangraal”, que é comumente entendido como “san graal”, - Santo Graal -, deveria ter sua leitura corrigida para “sang real”, o sangue real, que para eles significa uma linhagem sanguínea hereditária. Baigent, Leigh e Lincoln, conectam a ênfase dada à linhagem nas lendas do Graal com o que eles acreditam ser o grande segredo relacionado a Jesus e Madalena que teriam sido marido e mulher, e propõe sua própria teoria: o Graal das lendas era uma referencia simbólica aos descendentes de Jesus e Maria Madalena.
De acordo com esta teoria, os guardiões do Graal eram aqueles que conheciam essa linhagem sagrada secreta, como, por exemplo, os templários e o Monastério de Sion.
Entretanto, existe um problema com essa idéia: nas histórias do Graal a ênfase está na linhagem dos Guardiões do Graal e na dos descobridores do Graal: o próprio Graal é o que os está separando. Embora fosse bem possível que as lendas se referissem à guarda de um segredo mantido por certas famílias e que foi passado de geração para geração, parece improvável que eles realmente estivessem aludindo a uma linhagem sangüínea. Afinal, quando a idéia passou a ser cogitada ela veio à tona na forma de uma única palavra francesa “sangraal”, e, como já vimos, existem serias dificuldades em uma hipótese que se alicerça na idéia de continuidade de “uma linhagem sangüínea pura” através dos tempos.
A ligação entre as historias do Graal e o legado dos templários parece ser verdadeiro o suficiente. Wolfram Von Eschenbach é crível por ter viajado bastante e por conhecer os centros templários do Oriente Médio e por seu conto ser, de longe, o mais explicitamente templário de todos os romances sobre o Graal. Como diz Malcolm Godwin: ao longo de Parzival Wolfram entremeia seu relato com discussões sobre a astrologia, alquimia, a cabala e as novas idéias espirituais do oriente. Ele inclui também um obvio simbolismo que nos remete diretamente ao Tarô.
É nessa versão que os guardiões do Graal no Castelo Monsalvasch são explicitamente chamados de templários. O Castelo original foi identificado como sendo o de Montségur, a ultima das grandes fortalezas dos cátaros. A narrativa, em outro poema de Wolfram, invoca o Senhor do Graal do Castelo de Perilla. O verdadeiro senhor de Montségur à época do poeta era Ramon de Perella. Mais uma vez encontramos uma ligação entre os templários e cátaros, entre si e com um indefinido, porem extremamente valioso tesouro.
Não há qualquer taça dotada de poderes sobrenaturais na versão de Wolfram; aqui o Graal é uma pedra, “lapsit exillis”, que provavelmente significa a Pedra da Morte, embora isso seja mera especulação. Ninguém sabe realmente. Outras explicações afirmam que a pedra era uma jóia que se soltou da coroa de Lúcifer quando este decaiu do céu para a terra ou que é a famosa Pedra Filosofal “lápis elixir” dos alquimistas. Dentro do contesto, essa ultima interpretação é a mais provável: o texto todo é farto em simbolismo alquímico.
Alguns escritores viram a personagem Cundrie, a “mensageira do Graal” em Parzival, como sendo a representação de Maria Madalena. - Certamente Wagner assim o fez: em sua opera Parsifal, de 1882, sua Kundry possui um frasco de balsamo e lava os pés do herói, e então, como se fosse Madalena, seca-os com os próprios cabelos. Talvez haja alguma ressonância da taça do Graal na jarra de alabastro que Madalena carrega na tradicional iconografia cristã.
Em todas as historias, porem, a busca do Graal é uma alegoria para uma viagem espiritual do herói em direção - e para alem – da transformação pessoal. E como vimos, um dos principais motivos de toda alquimia séria era exatamente esse. Mas foi apenas este subtexto alquímico que fez com que todas as lendas de Graal fossem heréticas?
A igreja, sem duvida, sentia-se mortalmente ofendida pelo fato de as historias do Graal ignorarem ou absterem-se de afirmar sua autoridade e a sucessão apostólica. O herói age por si só, embora ocasionalmente receba ajuda, em sua busca de esclarecimento espiritual e transformação. Assim, em essência, as lendas do Graal são textos gnósticos que enfatizam a responsabilidade do individuo em relação ao estagio de evolução da sua própria alma.
Porem, existem muito mais coisas capazes de ofender a sensibilidade da igreja que estão implícitas em todas as historias do Graal. Pois a busca do Graal é, inevitavelmente, apresentada como sendo reservada apenas para os iniciados do mais alto grau - a nata da elite - algo que está muito alem até mesmo da trandescendencia da missa. Alem disso, em todas as historias do Graal, o próprio objeto, qualquer que ele seja, é guardado por mulheres. Até mesmo na historia celta de Peredur os jovens até podem portar uma lança, mas são as damas que levam o que podemos chamar de protótipo do Graal, a bandeja com a cabeça. Mas como poderiam as mulheres realizar um papel de autoridade em algo que era efetivamente uma forma mais sublime de Missa? Lembremos que os cátaros, cuja fortaleza de Montségur era quase com certeza o original para o Castelo do Graal de Wolfram, mantinham um sistema de igualdade sexual de forma que homens e mulheres poderiam ser chamados de “padres”.
No entanto, é a conexão com os templários que é mais difundida nas historias do Graal. Como vários comentadores apontaram, a acusação de que os cavaleiros adoravam uma cabeça decapitada - que se acreditava ser a de Baphomet - tem ressonância com os romances de Graal nos quais, como já vimos, as cabeças decapitadas aparecem em toda parte. Os templários foram acusados de atribuir a esse Baphomet poderes semelhantes aos do Graal: ele poderia fazer com que as arvores florescessem e a terra se tornasse fértil. Na verdade, os templários não só foram acusados de idolatrar essa cabeça, como também mantinham em seu poder um relicário de prata, na forma de um crânio feminino, no qual estava gravado simplesmente “caput” - cabeça.
Hugh Shonfield, ao considerar as implicações relacionadas a essa cabeça feminina, juntamente com sua “interpretação” da palavra Baphomet como significado de Sophia, escreve:
Parece haver pouca duvida de que a bela cabeça feminina dos templários representasse Sophia em seu aspecto feminino, assim como também Ísis, e ela estava conectada com Maria Madalena na interpretação cristã.
As relíquias dos templários também têm a reputação de incluírem o suposto dedo indicador de João Batista. Isso pode ser bem mais significativo do que parece a primeira vista. Como nos vimos, Leonardo, com freqüência, retratou alguns personagens em cenas religiosas que deliberada e ritualisticamente colocavam em riste seu dedo indicador, e esse gesto parece estar conectado com João Batista. Por exemplo, vimos como um individuo que parecia estar venerando uma alfarrobeira em “A Adoração dos Reis Magos” estava fazendo esse gesto: tanto a arvore quanto o gesto estão relacionados a João. A relíquia que afirmam ter pertencido aos templários pode ter sido a razão material que fez com que Leonardo adotasse tal imagem.
Jacobus de Voragine em seu livro “Golden Legend” narra uma tradição que diz que o dedo de João Batista, a única parte do cadáver sem cabeça que escapou da destruição ordenada pelo imperador Juliano, foi trazido para a França por Santa Thecla, e então, talvez possa haver alguma razão para se acreditar que a relíquia dos templários e aquela da lenda sejam a mesma. Voragine também registra a lenda que conta que a cabeça de Batista foi enterrada debaixo do Templo de Herodes, em Jerusalém, onde os templários escavaram.
Os templários estão constantemente vinculados ao Graal. A escritora viajante britânica Nina Epton descreve, em seu livro “The Valley of Pyrene” -1955, como ela escalou até as ruínas do castelo de Montréal-de-Sos, dos templários no Ariége, para ver os murais que retratam uma lança com tres gotas de sangue e um cálice, uma imagem que foi, claramente, tomada diretamente das lendas do Graal.
Outra pintura estranha foi encontrada no castelo em Domme, onde muitos templários foram presos. Ean e Deike Begg descrevem uma estranha cena da crucificação na qual José de Arimatéia - segurando uma cruz de Lorraine - é mostrado, a direita, colhendo gotas do sangue de Jesus. Á esquerda está uma mulher grávida e nua que segura uma vara ou bastão.
Existem outras ligações mais curiosas. Em St-Martin-do-Vésuvie, na Provença, que, como vimos, é um centro renomado de Madonas Negras e de locais associados aos templários, há uma lenda que incorpora elementos interessantes da historia do Graal. Afirma-se que os templários foram todos decapitados durante sua supressão – algo que, dada a falta completa de verificação oficial, parece ser extremamente improvável – e que eles amaldiçoaram a terra com mangra. Os homens ficariam impotentes ou estéreis e a terra infértil. Qualquer que seja a verdade sobre esse assunto é um fato histórico que em 1560 o Duque Emmanuel Filibert de Savoy mandou exorcizar a terra, pois essa se encontrava em um estado lastimável. Na verdade, um dos cumes das redondezas ainda é conhecido como Maledia, que pode ser traduzido como doença.
Mas a parte mais significativa desse conto pesaroso é a que vincula a decapitação des templários com a mangra espalhada na terra, dois dos principais elementos do cânone do Graal. Para os escritores de historias do Graal havia algo sobre as cabeças decapitadas, ou talvez a cabeça decapitada que havia trazido a destruição da terra, embora também pudesse representar uma dádiva aqueles a quem ela favorecesse.

As diferentes historias do Graal e as varias correntes existentes podem parecer algo confusas, mas em seu monumental estudo sobre as lendas do Santo Graal, “The Hidden Church of the Holy Grail” -1902, o grande erudito do ocultismo A.E.Waite, destacou a presença de uma tradição secreta dentro do cristianismo que estava por trás de todo o conceito das lendas. Waite foi um dos primeiros a reconhecer os elementos alquímicos, herméticos e gnósticos dessas historias. Embora estivesse certo de que existem fortes indícios sobre a existência dessa “igreja oculta” das lendas do Graal, ele não chega a qualquer conclusão realmente firme sobre sua natureza, mas dá uma posição proeminente àquilo que chamou de “Traição Joanina”. Ele se refere a uma idéia, há muito defendida em círculos esotéricos, da existência de uma escola de cristianismo mística que teria sido fundada por João o Evangelista em base a ensinamentos secretos que recebera de Jesus. Esse conhecimento enigmático não aparece no cristianismo externo, ou esotérico, que se desenvolveu através dos ensinamentos de Pedro. É bastante significativo que Waite achasse que essa tradição chegara à Europa através de Gaul, no sul da França, antes de ter sido filtrada pela recente igreja Celta da Bretanha.
Apesar dos elementos celtas na história do Graal, Waite entende que a influencia joanina nelas presente origina-se no Oriente Médio, via templários. Astutamente, ele não afirma que essa é a única conexão possível, pois não há evidencia conclusiva para isso, mas acredita que essa é a mais plausível. Porém ele tem certeza de que os romances do Graal baseavam-se em algum tipo de “igreja oculta” que estava ligada aos templários.
As historias do Graal também são uma manifestação das idéias nascidas no submundo que estavam circulando na França medieval sob os auspícios dos templários, como o culto das Madonas Negras. A conexão entre os dois é impressionante. Ambos baseiam-se em antigos temas pagãos: as historias do Graal em mitos celtas e o culto das Madonas Negras em santuários dedicados a deusas pagãs. Ambos floresceram nos séculos XII e XIII devido ao contato, através dos templários, com a Terra Santa. Os templários eram um repositório do conhecimento de diversas fontes esotéricas, incluindo alquimia e a sexualidade sagrada. A conexão entre as Madonas Negras, templários e alquimia é assunto de um estudo do historiador francês Jaques Huynen, chamado “L´enigme des Vieges Noires” - O Enigma das Virgens Negras, 1972. É a “ponte” entre suas idéias exóticas e esotéricas, com o mundo cristão de sua época, estava personificado na imagem de uma mulher: Maria Madalena.
A Cruzada que exterminou os cátaro taxando-os de hereges, com certeza não manteve a mesma eficiência contra os muitos bem organizados templários, uma vez que é muito improvável que estes aguardasses humildemente o momento de morrer. Para começar, nem todos os cavaleiros que estavam na Europa foram simultaneamente reunidos naquela sexta-feira, 13. O cataclismo que se abateu sobre a Ordem só aconteceu na França, e mesmo lá alguns cavaleiros puderam escapar. Em outros países aconteceu, digamos, uma escala variável de perseguição e supressão. Na Inglaterra, por exemplo, Eduardo II recusou-se a acreditar que os templários fossem culpados daquilo que eram acusados, chegando mesmo a debater, acaloradamente, essa questão com o papa, recusando-se, terminantemente, de torturar os cavaleiros.
Na Alemanha aconteceu uma cena profundamente hilariante. Hugo de Gumbach, Mestre templário da Alemanha, fez uma entrada teatral no conselho convocado pelo arcebispo de Metz - portando armadura completa e acompanhado de vinte cavaleiros endurecidos pelas batalhas e escolhidos a dedo – e proclamou que o papa era o mal e que deveria ser deposto; que a Ordem era inocente e que seus homens estavam dispostos a resistir militarmente ao julgamento.
Em Aragon e Castela, os bispos conduziram o julgamento dos templários apenas para, no final, inocentá-los. Contudo, a ordem do papa para dissolver a Ordem dos Cavaleiros Templários em 1312 não teve como ser ignorada.No entanto, mesmo na França, relativamente poucos foram executados. Muitos foram libertados depois de se retratarem e em outros países eles simplesmente passaram a usar outro nome, ou uniram-se a outras Ordens já existentes como a dos Cavaleiros Teutônicos.
Fonte: livro “A Grande Heresia” de Lynn Picknett e Clive Prince,
publicado no Brasil por Beca – Produções Culturais Ltda.

Os apelos do Alto continuaram a solicitar a atenção da igreja romana em todas as direções. As chamadas heresias brotavam por toda parte que houvesse consciências livres e corações sinceros, mas as autoridades do catolicismo nunca se mostraram dispostas a receber semelhantes exortações.
Havia terminado, em 1229, a guerra contra os hereges, cujos embates atravessaram o espaço de vinte anos, quando alguns chefes da igreja consideraram a oportunidade da fundação do tribunal da penitencia, cujos projetos de há muito preocupavam o pensamento do Vaticano.
Mascarar-se-ia o cometimento com o pretexto da necessidade de unificação religiosa, mas a realidade é que a instituição desejava dilatar o seu vasto domínio sobre as consciências.
Todavia, se a inquisição preocupou longamente as autoridades da igreja, antes da sua fundação, o negro projeto preocupava igualmente o Espaço, onde se aprestaram providencias e medidas de renovação educativa. Por isso, um dos maiores apóstolos de Jesus desceu à carne com o nome de Francisco de Assis. Seu grande e luminoso espírito resplandeceu próximo de Roma, nas regiões da Úmbria desolada. Sua atividade reformista verificou-se sem os atritos próprios da palavra, porque o seu sacerdócio foi exemplo na pobreza e na mais absoluta humildade. A igreja, todavia, não entendeu que a lição lhe dizia respeito e, ainda uma vez, não aceitou as dádivas de Jesus.
O esforço poderoso do missionário, todavia, se não conseguiu mudar a corrente de ambições dos papas romanos, deixou traços fulgurantes da sua passagem pelo planeta.
Seu exemplo de simplicidade e de amor, de singeleza e de fé, contagiou numerosas criaturas, que se entregaram ao santo mister de regenerar almas para Jesus.
A ordem dos franciscanos chegou a congregar mais de duzentos mil missionários e seguidores do grande inspirado. Eles repeliam qualquer auxilio pecuniário, para aceitar tão somente os alimentos mais pobres e mais grosseiros, e o característico que mais os destacava das outras comunidades religiosas era o seu alheamento aos mosteiros. Em vez de repousarem á sombra de claustros, na tranqüilidade e na meditação, esses espíritos abnegados reconheciam que a melhor oração, para Deus, é a do trabalho construtivo, no aperfeiçoamento do mundo e dos corações.
Fonte: livro “A Caminho da Luz” pelo espírito Emmanuel
e psicografado por Francisco Candido Xavier